O triunfo dos cafajestes





Laurez Cerqueira

Brasília brilha sob o sol e o céu de maio, talvez o mais azul dos céus do Brasil. Tão azul que pode ser riscado com giz.

Esparramada no cerrado pintado de arbustos cobertos por flores brancas, rosas e lilases, neste outono, a cidade avança na "marcha para o Oeste", ainda atraindo gente, integrando e levando desenvolvimento para todos os cantos do Brasil, como sonhado pelos idealizadores.

Historicamente tão jovem, a cidade guarda na memória momentos dramáticos: tentativas de golpe no governo Juscelino Kubitschek; o golpe de 1964, com tanques nas avenidas, e 21 anos de ditadura militar; o impeachment do ex-presidente Fernando Collor; e agora a trama do primeiro golpe de Estado do Brasil, sem armas, forjado nos gabinetes das próprias instituições da República, seguindo o modelo aplicado na Guatemala e no Paraguai, tendo o Judiciário e os órgãos auxiliares, Ministério Público e Polícia Federal, como ponta de lança.

No Palácio do Planalto, a Presidente Dilma, a primeira mulher eleita e reeleita democraticamente, resiste bravamente ao golpe comandado pelo presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, em parceria com o vice-presidente Michel Temer, apoiado por uma horda de parlamentares do mais baixo nível da história da República (agora nas mãos do presidente do Senado, Renan Calheiros).

Eduardo Cunha tem demonstrado que ele é o mais poderoso entre os conspiradores. Além de ter a maior fatia do Congresso a seus pés, como ficou claro na votação do pedido de impeachment da Presidenta Dilma, Eduardo Cunha demonstra também ter ascensão sobre o Vice-presidente Michel Temer e o presidente do Senado, Renan Calheiros.

Um mistério ronda a figura de Eduardo Cunha, réu no STF, respondendo a vários inquéritos. Não se sabe exatamente a extensão dos tentáculos dele tanto nos paraísos fiscais quanto na teia de políticos e magistrados.

As contas na Suíça são o mais importante que se conseguiu descobrir. Mas existem outros paraísos fiscais como as ilhas Cayman, países da América Central, da África e da Ásia, que também operam com dinheiro clandestino, proveniente de corrupção e do narcotráfico.

Há quanto tempo Eduardo Cunha opera para o PMDB de Michel Temer, de Moreira Franco, de Eliseu Padilha, de Romero Jucá, e de tantos outros, que nón los puedo contar?

Há suspeitas de que ele, como um homem extremamente competente no ramo da corrupção, deve ter gravações de todos os negócios do submundo da roubalheira, das tratativas de ações políticas e judiciais, e que isso provavelmente tenha se transformado numa arma muito poderosa para chantagem e submissão dos seus asseclas aos seus desígnios.

Talvez por isso, Eduardo Cunha reina no Brasil sem que ninguém o detenha, o destitua da presidência da Câmara e o prenda. Ele, a mulher e a filha, com todas as provas apuradas, flanam sob contemplação de magistrados, da Polícia Federal, do Ministério Público e do STF e deve rir da cara de todos eles.

Eduardo Cunha debocha das autoridades, desobedece ordem judicial do ministro Marco Aurélio Melo, do STF, não instala comissão para investigar o vice Michel Temer, que se encontra sob a mesma acusação de ter assinado decretos das tais "pedaladas fiscais". Mas magistrados mandam prender inocentes, sem provas, perseguem e humilham pessoas, como, por exemplo, o ex-presidente Lula e sua família.

Temer deve tremer diante de Eduardo Cunha. No auge da explosão do esquema da Petrobras, Temer era presidente do PMDB, função que exerceu anos a fio.

Ele é citado em quatro delações premiadas, mas não se fala mais nisso. Os fatos indicam que Eduardo Cunha sabe de detalhes da vida de Temer e das ramificações do financiamento de campanhas eleitorais do PMDB. Praticamente toda a cúpula do partido está sendo investigada.

Recentemente Eduardo Cunha desafiou as instituições da República quando disse que permanecerá no cargo de presidente da Câmara até 2017. Ele está seguro disso, conseguiu maioria no Conselho de Ética da Câmara e não permite aprovar o pedido de cassação do seu mandato.

Ele tem votos no Plenário da Câmara, suficientes para mandar arquivar qualquer processo de cassação de seu mandato.

Se for afastado da Presidência da Câmara, pelo Supremo Tribunal Federal, ele tem votos na bancada para se eleger líder do PMDB e de lá comandará a Câmara do mesmo jeito. Ele tem a bancada que votou na admissão do processo de impeachment da Presidente Dilma na mão.

Se cada voto para aprovar o projeto que possibilitou a reeleição de Fernando Henrique Cardoso custou R$ 200 mil, como foi denunciado pelo ex-deputado Ronivon Santiago ao jornal Folha de São Paulo, à época, é possível imaginar que, caso tenha havido compra de votos para aprovar a instauração de processo de impeachment da Presidenta Dilma, o preço de cada voto pode ter atingido valor recorde.

O fato é que Eduardo Cunha se apresenta como o mais bem acabado político do Congresso para fazer o serviço sujo do grande capital. É provável, que não existe no Brasil alguém mais credenciado e capaz do que ele para operar os negócios de interesses da elite brasileira e das grandes corporações internacionais.

O mundo dos grandes negócios precisa dele. Ele é peça estratégica para as ações do grande capital e tem poder para isso.

Federações de Indústrias (Fiesp e outras), Federação dos Bancos (Febraban), corretoras de bolsas de valores, especuladores financeiros daqui e das nações centrais devem estar prontos para os negócios.

Num eventual governo de Michel Temer, Eduardo Cunha, na Câmara, pode transformá-lo numa espécie de despachante de luxo do Palácio do Planalto, um office boy, talvez, tamanha a rede de negócios que esse senhor deve operar.

Eduardo Cunha poderá comandar a pauta de votações não só da Câmara, mas do Congresso como um todo. Ele deu demonstração de ascendência sobre Renan Calheiros ao ir ao Senado dizer, em tom de ordem, para acelerar o afastamento da Presidenta Dilma. Suspendeu a pauta de votações da Câmara e disse que realizará sessões deliberativas somente após a aprovação do impeatchment e ponto. Ele tem pressa. E o presidente do Senado, Renan Calheiros, está cumprindo o que disse Eduardo Cunha.

As Medidas Provisórias e os Projetos de Lei anunciados por Michel Temer, que já estão sendo preparados, devem tratar das privatizações do Pré-Sal, dos bancos públicos (Banco do Brasil, CEF, BNDES), empresas do setor elétrico, serviços de saúde pública e educação, e outros e outras áreas, a terceirização, subtração de direitos dos trabalhadores (reforma da CLT), reforma da previdência, serão votados a toque de caixa. Será rápido e comandado por Eduardo Cunha. Afinal, ele é o rei do Congresso, o gerente do golpe.

O Brasil não está sendo vítima apenas de um golpe de Estado institucional, mas de um assalto ao patrimônio público e aos direitos conquistados pela sociedade, comandado por um bandido de alta periculosidade, que fez o Brasil refém dele.

Num eventual governo Temer, o Brasil será retirado do grupo do BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) e recolocado na malha de negócios dos Estados Unidos e da Europa, num processo de ressubordinação às nações centrais, coloniais.

A Alca (Área de Livre Comércio das Américas), projeto do governo Bush, barrada no governo Lula, deve voltar a ser rearticulada com a retirada do Brasil do MERCOSUL. Isso já foi anunciado por Aécio Neves, na campanha eleitoral, em 2014, e reafirmada recentemente por José Serra.

O Brasil tem mais da metade do PIB da América Latina. Sem o Brasil não há Alca. O Brasil poderá se transformar num mercado consumidor dos produtos dos Estados Unidos, ter sua indústria liquidada, com perdas estruturais de empregos.

Com o agravamento da crise internacional, as nações centrais estão estabelecendo políticas internacionais predatórias para buscar nas nações periféricas compensações de suas perdas econômicas, como sempre acontece com a vinculação empresarial desde a colonização.

Ao longo da história, todas as vezes que o Brasil experimentou projetos desenvolvimentistas com inclusão social, associados a políticas externas autônomas, de projeção da soberania, os governos foram solapados e até derrubados por forças políticas que atuam no país na defesa de interesses externos.

Foi assim com Vargas, quando ele colocou como prioridade de seu governo o fomento à industrialização, à infraestrutura de desenvolvimento e a afirmação de direitos dos mais desfavorecidos; com Juscelino Kubitschek, com seu plano de metas, 50 anos em 5; com João Goulart e as reformas de base; e com Lula e Dilma, com o projeto de desenvolvimento sustentável, tendo o Estado como indutor do crescimento, da redução das desigualdades regional e social, e inclusão dos deserdados no acesso aos serviços públicos e na afirmação de direitos.

Desta vez o golpe não quis saber dos militares, não há mais "Guerra Fria", não existe mais a ameaça comunista, mas negócios a fazer. Para os negociantes golpistas, militares são coisa velha, atrapalhariam os grandes negócios tendo em vista o fato de serem, em geral, nacionalistas.

O modelo de golpe de Estado institucional faz escola. É cirúrgico, eficaz, fácil de articular. Basta contar com um roteiro, trama e personagens que leve, ao final, às pessoas e instituições escolhidas para serem aniquiladas politicamente, moralmente, e com setores do Judiciário, do Ministério Público e da Polícia Federal, para dar a forma de legalidade ao golpe.

A narrativa fica por conta da mídia plutocrata, das redes sociais, que se encarregam da narrativa e da mobilização de gente para encher as ruas, e assim construir a sustentação da opinião pública.

Para finalizar, sem um Congresso corrupto não haverá golpe institucional. O arremate final do tecido da "legalidade" é dado pelo Congresso, como foi feito no dia 17 de abril, quando foi aprovada abertura de processo de impeachment da Presidenta Dilma.

Depois daquele dia, o comportamento do Judiciário, da mídia e do Congresso passaram a ser o assunto mais discutido nas grandes redes de notícia do mundo, como algo bizarro, picaresco, de uma República da vala das nas nações mais atrasadas do mundo.

O roteiro do golpe, tendo a tal da "teoria do domínio do fato", como a mais importante e poderosa arma para derrubar o governo, está sendo tratada nos fóruns e pela imprensa internacional com jabuticaba, utilizada no Brasil para aniquilar pessoas e instituições, previamente escolhidas, por magistrados, procuradores e policiais, com base em orientação política ideológica. O golpe virou chacota mundo afora.

O jurista alemão, Claus Roxin, que esteve no Brasil discutindo o assunto em algumas universidades, condenou a utilização de sua teoria pelo judiciário brasileiro, por ter condenado, sem provas, pessoas inocentes.

A seletividade política dos órgãos judiciais é explícita. Uma das mais emblemáticas foi o engavetamento pelo Ministério Público, nas gestões dos procuradores Roberto Gurgel e Rodrigo Janot, das denúncias contra o senador Aécio Neves, candidato derrotado nas eleições e um dos principais articuladores do golpe.

A famosa Lista de Furnas e outras denúncias, dormiam nas gavetas dos procuradores. Agora não há mais como proteger o senador. Está confirmado com documentos, em poder do Ministério Público, que dona Inês Maria Neves Faria, mãe de Aécio Neves, é a principal beneficiária da Fundação Bogart & Taylor, no Banco LGT, em Liechtenstein, paraíso fiscal na Europa. Por que a mãe de Aécio Neves mantém uma fundação com contas num paiseco europeu?

Essa denúncia compromete definitivamente o homem que sempre teve e tem microfones e câmeras ao inteiro dispor, das maiores redes de mídia do país, para fazer acusações vis, levianas, criminosas, de corrupção, contra muitas pessoas inocentes.

Aécio Neves tenta nomear o ministro da Justiça do eventual governo Temer. Mas um ministro que seja capaz de desarticular a Operação Lava Jato e outras investigações que poderão avançar no sentido dele e de seus correligionários. Com o Ministério da Justiça ele controla a Polícia Federal. Essa estratégia é de interesse de Eduardo Cunha e outros investigados.

Brasília continua linda, com seus gramados e arvores de verde viçoso, de jardins floridos, debaixo de uma imensa abóbada celestial azul durante o dia, e, à noite, coberta de estrelas de infinita beleza, mas testemunhando uma das maiores injustiça da história do Brasil: a condenação, sem crime, da Presidenta Dilma Rousseff, eleita democraticamente com 54 milhões de votos.

Dilma é uma mulher honesta, digna e honrada, uma revolucionária cuja biografia figurará na galeria de nossa história ao lado de outras mulheres também lutadoras pela liberdade, justiça e democracia, como Clara Camarão, Anita Garibaldi, Hipólita Jacinta Teixeira de Mello, Maria Quitéria de Jesus, Maria da Glória Sacramento, Nísia Floresta Augusta, Maria Firmina dos Reis, Chiquinha Gonzaga, Maria Amélia de Queiroz, Leolinda Daltro, Maria Lacerda de Moura, e muitas outras mulheres brasileiras que foram e vão à luta.


Laurez Cerqueira  Laurez Cerqueira - Autor, entre outros trabalhos, de Florestan Fernandes - vida e obra; Florestan Fernandes – um mestre radical; e O Outro Lado do Real


Postado no Brasil247 em 03/05/2016









SETE
Destino : Graves retrocessos para o Brasil

 
Golpe é coisa do Capeta então as consequências serão nefastas ...



Festas Inverno 2016 : Vestidos maravilhosos


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Vídeo lindo : Rio de Janeiro denuncia o GOLPE no Brasil para o mundo #StopCoupInBRazil





A ação foi puxada por um grupo de ativistas que reúne pessoas de várias cidades do mundo, sua atuação visa colaborar com ações contra o Golpe em curso no Brasil.  






Pode me contrariar, eu dou conta !






Emilia Freire

E não é que na semana em que decido mudar de casa, arrumar um novo ninho, gastar as pobres economias com todo o aparato de mudança e pintura e uma coisinha aqui e outra ali, a lavadora resolve quebrar? Ela decerto não gostou da ideia, não queria sair do seu pedestal imponente; talvez tenha ouvido alguém comentar que iria para uma área externa.

Pois é, foi-se ela. Partiu dessa para um ferro velho melhor. E cheia d’água para dar bastante trabalho, sujeira e contrariedade.

E no mesmo dia a sandália arrebentou, o preço daquela mesinha que eu estava paquerando aumentou, a internet rateou, a paciência quase acabou.

Creio que um dos maiores desafios desse vida moderna, é o de ser contrariado. A tecnologia ainda reforça isso, instigando respostas rápidas, caminhos alternativos, decisões certeiras e instantâneas.

Mas a vida não é bem assim, e mesmo quem usa o mais top, fantástico e extraordinário equipamento, vez ou outra tem o seu chinelo arrebentado, ou sua internet congelada. Contrariedades…

Matutando sobre isso, decidi enxergar as contrariedades com uma outra lente, aquela mesma do óculos que já não serve mais, mas faz o feio ficar desfocado, mas bonitinho.

Contrariedade é como aquela pessoa decidida a te provocar. Uma, duas, várias vezes, até você explodir. Experimenta sorrir para ela e encarar até ela desviar o olhar. Acabou, você venceu.

Contrariedade é o professor que não quer testar seus conhecimentos, e sim te pegar num descuido. Ele pode até conseguir pegar, mas não consegue cumprir a própria missão.

Contrariedade é gente que sente prazer em contar notícia ruim, em provocar agonias e medos. Mas, se não houver quem ouça, o vento leva para longe, as notícias e as agonias.

As contrariedades já me viraram do avesso, me tiraram do prumo, da educação, da organização e segurança.

Mas a vida é isso! É botar o pé no chão e encarar o movimento que essa pisada provocou. Pode tudo dar certo, e, na maioria das vezes, dá mesmo. O que não deu, o que contrariou, vira experiência, vira bagagem, sabedoria.

Daqui para frente, e isso é uma promessa, elas vão chegar, fazer suas mandingas e bater em retirada. Não tem contrariedade que ouse me segurar!

Vai me contrariar? Pode vir que eu dou conta. E ainda mando a conta, se for o caso.


Postado no Conti Outra



Golpe é parte de um projeto de recolonização da América Latina


Guilherme Santos/Sul21: <p>30/04/2016 - PORTO ALEGRE, RS - Entrevista com o prêmio Nobel da Paz de 1980, argentino Adolfo Pérez Esquivel. Foto: Guilherme Santos/Sul21</p>


Adolfo Pérez Esquivel, Nobel da Paz em 1980, afirma em entrevista ao portal Sul 21 que esteve no Brasil "para apoiar a democracia, a continuidade constitucional e evitar a consumação de um golpe de Estado"; "Pelo trabalho que realizo, sempre olho para a realidade de um país da América Latina sob a perspectiva de uma visão continental. Não há casualidades em tudo o que está acontecendo agora contra o governo de Dilma. Isso faz parte de um projeto de recolonização continental", avalia.



Marco Weissheimer, Sul 21


Adolfo Pérez Esquivel, Nobel da Paz em 1980, precisou falar apenas um minuto no Senado brasileiro para sentir de perto a fúria da oposição que busca derrubar a presidenta Dilma Rousseff

O arquiteto e ativista argentino utilizou a palavra “golpe” para definir o que está acontecendo hoje no Brasil, o que levou a oposição a exigir do senador Paulo Paim (PT-RS), que presidia a sessão, a retirada da palavra dos anais da sessão, demanda que acabou atendida. 

“Não falei mais de um minuto. Eles me pediram para que eu fizesse uma saudação e eu expliquei por que estava aqui no Brasil, para apoiar a democracia, a continuidade constitucional e evitar a consumação de um golpe de Estado”, relata Esquivel em entrevista ao Sul21.

Na entrevista, o arquiteto e ativista argentino chama a atenção para o fato de que o que está acontecendo no Brasil não é um ponto fora da curva, mas sim parte de um projeto de recolonização da América Latina capitaneado pelos Estados Unidos

Para Esquivel, não há acasos em tudo o que está acontecendo agora contra o governo de Dilma. “Isso faz parte de um projeto de recolonização continental. Já houve experiências piloto no continente que devem ser lembradas. A metodologia é a mesma. O que aconteceu em Honduras, com a derrubada de Manuel Zelaya, e depois no Paraguai, contra o governo de Fernando Lugo, foram ensaios de golpes de Estado de um novo tipo”, sustenta.

“Esse projeto”, acrescenta, tem como objetivos estratégicos o controle dos nossos recursos naturais e, como já disse Michel Temer, a privatização das empresas estatais”. “Esse é o objetivo do golpe de Estado. Caso ele se consume, o país terá um governo com essa agenda que não foi eleito pelo povo”.

Sul21: Como o senhor avalia a situação política que o Brasil vive hoje, em especial a tentativa de derrubada do governo da presidente Dilma Rousseff?

Adolfo Pérez Esquivel: Pelo trabalho que realizo, sempre olho para a realidade de um país da América Latina sob a perspectiva de uma visão continental. Não há casualidades em tudo o que está acontecendo agora contra o governo de Dilma. Isso faz parte de um projeto de recolonização continental. Já houve experiências piloto no continente que devem ser lembradas.

A metodologia é a mesma. O que aconteceu em Honduras, com a derrubada de Manuel Zelaya, e depois no Paraguai, contra o governo de Fernando Lugo, foram ensaios de golpes de Estado de um novo tipo. Golpes de Estado que não necessitam dos exércitos. Basta ter os meios de comunicação, alguns juízes e dirigentes políticos da oposição para provocar a desestabilização de um governo.

O que me assombra é que tenham escolhido o Brasil, um país líder no continente, para aplicar esse modelo de golpe. É o mesmo procedimento dos ensaios realizados anteriormente: o uso massivo dos meios de comunicação para alimentar um processo de desprestígio por meio de uma série de acusações, a cumplicidade de alguns juízes, como é o exemplo de Sérgio Moro, que chegou a vazar escutas telefônicas privadas envolvendo o ex-presidente Lula e a própria presidente da República.

O que Dilma fez de errado, afinal, para justificar um impeachment? Ela utilizou procedimentos que outros governos anteriores também aplicaram e não sofreram nenhum tipo de sanção por isso. Contra Dilma, bastou isso para justificar um pedido de impeachment. Isso é, abertamente, um golpe de Estado brando. Há alguns dias, disse isso no Senado brasileiro e houve um escândalo. Não falei mais de um minuto…

Sul21: E pediram para retirar a palavra “golpe” das atas do Senado relativas ao seu pronunciamento…

Adolfo Pérez Esquivel: Sim. Eles me pediram para que eu fizesse uma saudação e eu expliquei por que estava aqui no Brasil, para apoiar a democracia, a continuidade constitucional e evitar a consumação de um golpe de Estado. Bastou isso para provocar uma situação conflitiva. Mas é preciso fazer uma leitura mais profunda sobre o que está acontecendo no Brasil. Essa leitura para além da superfície tem a ver com o projeto em curso de recolonização do continente. Esse projeto tem alguns objetivos estratégicos: o controle dos nossos recursos naturais e, como já disse Michel Temer, a privatização das empresas estatais. Esse é o objetivo do golpe de Estado.

Caso ele se consuma, o país terá um governo que não foi eleito pelo povo, que ficará marginalizado da ação democrática. Como ocorreu em Honduras e no Paraguai, isso terá como consequência uma forte repressão aos movimentos sociais. Essa é a lógica da imposição de uma política regressiva: provocar situações de conflitos sociais e usar a forma repressiva para conter esses conflitos. Já há uma lei antiterrorista aprovada pelo Congresso, como aconteceu em quase todos os países.

Há uma diferença entre o que está acontecendo no Brasil e o que vemos hoje na Argentina, onde a direita chegou ao governo por meio de eleições livres. Ganhou por muito pouco, mas ganhou e está legitimada pelo voto. Nos primeiros quatro meses de governo, Macri levantou impostos que eram cobrados de empresas mineradoras e de latifundiários, entre outras medidas. O Observatório Social da Universidade Católica Argentina registrou que, neste período, o país já tem um milhão e quatrocentos mil de pobres a mais e cem mil desempregados a mais. Isso em quatro meses apenas.

Sul21: Na sua avaliação, esse projeto de recolonização tem os Estados Unidos como centro de origem e de articulação?

Adolfo Pérez Esquivel: Sim, é uma política dos Estados Unidos, que nunca abriu mão de seu objetivo de ter a América Latina como seu quintal. 

A política norte-americana nos golpes em Honduras e no Paraguai ficou muito clara. É preciso ter em mente que os Estados Unidos e também a Europa estão esgotando seus recursos e necessitam dos recursos naturais de nossos países, incluindo recursos minerais estratégicos e os recursos do Aquífero Guarani, uma das grandes reservas mundiais de água, um bem cada vez mais escasso. Então, não são pequenos os interesses dos Estados Unidos na região. Não é por outra razão que eles mantém bases militares na América Latina.

Se olharmos para a história recente da América Latina, houve outras tentativas de golpe de Estado no Equador, na Bolívia e na Venezuela que vive uma situação crítica, onde a posição ganhou o Parlamento e o governo de Nicolas Maduro está muito debilitado, com graves problemas econômicos, fundamentalmente causados pela queda do preço do petróleo, base da economia venezuelana. Então, as tentativas de golpe de Estado na América Latina não terminaram. Houve algumas muito violentas, com muitas mortes, como a que ocorreu no massacre de Pando, na Bolívia. No Equador, tivemos uma tentativa de golpe disfarçada de uma mobilização salarial da polícia. Era uma tentativa de golpe de Estado contra Rafael Correa. Esse é o panorama que temos hoje na região. Teríamos que falar ainda de Haiti, Guatemala, El Salvador e Honduras onde ocorreu uma repressão brutal, com mortes como a de Berta Caceres, uma dirigente do povo Lenca com a qual trabalhamos em Honduras.

Sul21: Voltando um pouco à situação da Argentina, nos primeiros meses do governo Macri houve também um aumento da repressão aos movimentos sociais e um dos principais símbolos disso foi a prisão de Milagro Sala. Qual é o cenário atual desse quadro de repressão e violação de direitos?

Adolfo Pérez Esquivel: Milagro Sala é uma presa política. Ela foi presa por conta de um protesto social organizado por cooperativas e pelo grupo Tupac Amaru. Nós fomos visitá-la na prisão, na província de Jujuy, cerca de 1.500 quilômetros de Buenos Aires. Falamos também com o governador de Jujuy, Ruben Gerardo Morales. Após a prisão de Milagro Sala começaram a surgir uma série de outras acusações contra ela, envolvendo denúncias de corrupção e outras coisas. Mas ela foi condenada antes de ser julgada. Ela é uma presa política já há quatro meses e nós cobramos isso do governador. Houve também uma forte repressão policial em Buenos Aires e em outros lugares contra protestos de trabalhadores.

O governo Macri vai avançando em suas políticas neoliberais. Até agora, não falou abertamente sobre isso, mas planeja a privatização de empresas do Estado.

Macri também está fazendo um acordo com os fundos abutres para o pagamento de uma dívida externa imoral e ilegítima. Aí temos um problema que vem dos governos anteriores que não fizeram uma auditoria para determinar o que é dívida legítima e o que não é. Agora, Macri necessita de recursos para enfrentar a situação do país e está tentando obter empréstimos com altas taxas de juro. Os orçamentos para educação e políticas sociais sofreram grandes cortes e as obras do Estado estão paralisadas. As universidades também sofreram um drástico corte orçamentário. De modo geral, elas têm recursos para pagar os salários do mês de junho e depois não se sabe como será.

Sul21: Diante desse cenário de avanço conservador, qual é, na sua opinião, a capacidade de reação dos movimentos sociais e do movimento sindical na Argentina, no Brasil e em outros países da América Latina? Há força suficiente para resistir a esse projeto de recolonização?

Adolfo Pérez Esquivel: Os movimentos sociais estão muito fragmentados e isso coloca-os em uma forte situação de debilidade. Não há coesão ou força integradora entre eles. 

No caso da Argentina e de outros países da América Latina, a política de direitos humanos também enfrenta sérias dificuldades já há algum tempo. 

Esse projeto de recolonização terá um impacto negativo muito grande para a população, especialmente para os setores mais carentes. Há uma cláusula democrática dentro de organismos regionais como Mercosul e Unasul, que já foi aplicada ao Paraguai por ocasião do golpe contra Lugo. O Paraguai foi suspenso desses blocos regionais. Não sei se isso vai acontecer com o Brasil. Se, do golpe, surgir um governo Temer penso que ele terá o reconhecimento ao menos dos Estados Unidos e da Argentina. Na Argentina, o governo Macri está rechaçando os acordos regionais.

Sul21: Aqui no Brasil, estamos assistindo à emergência de grupos de direita e mesmo de extrema direita, com traços fascistas, que contam inclusive com representação parlamentar como é o caso do deputado Bolsonaro que, recentemente, voltou a fazer apologia de torturadores. Esse fenômeno também está ocorrendo na Argentina ou em outros países da região? Até que ponto, essa emergência preocupa?

Adolfo Pérez Esquivel: Na Argentina, isso não é muito evidente. Houve editoriais apoiando a ditadura, como o publicado pelo jornal La Nación no dia seguinte à posse de Macri, defendendo a libertação de militares condenados por crimes na ditadura. Há grupos de direita, mas, neste momento, como estão praticamente no governo, não se manifestam publicamente. Isso não significa que não existam. 

Aqui no Brasil me chama muito a atenção o fato de um deputado ter feito a defesa de um torturador. Isso é a apologia de um crime, um delito. Não sei como vão tratar isso, pois os deputados têm foro privilegiado. A questão importante é se haverá unidade dos movimentos sociais e populares para enfrentar essa situação.

Sul21: O senhor acompanha a situação dos direitos humanos na América Latina há muitos anos. Após um ciclo de ditaduras houve um período de redemocratização e uma ascensão de governos de esquerda e progressistas na região. Agora, parece que estamos entrando mais uma vez em um período conservador com regressão no campo dos direitos. Parece que parcelas importantes das sociedades latino-americanas abrem mão muito facilmente de direitos. Como avalia a situação atual após um período em que ocorreram importantes avanços na área dos direitos humanos e sociais?

Adolfo Pérez Esquivel: Neste último período, nós acompanhamos com preocupação a situação dos direitos humanos mesmo em governos democráticos. Há governos que não têm políticas repressivas, mas há como que uma base já institucionalizada. 

Em muitos países, as torturas em prisões e delegacias de polícia, por exemplo, continuam até o dia de hoje. Na Argentina, esse problema é tremendo. Nós fizemos um trabalho de monitoramento da situação em prisões e delegacias. No ano passado registramos mais de 100 mil casos de tortura em 50 instituições penitenciárias. Não são políticas de Estado, mas sim mecanismos e práticas que seguiram vivas nas forças de segurança e que seguem vigentes.

Os direitos humanos seguem sendo violados porque há impunidade jurídica. Quem viola os direitos humanos sempre é o Estado. Fora disso, há os delitos que devem ser enquadrados na legislação vigente. A situação dos direitos humanos, considerados em sua integralidade, é preocupante em muitos países. Não estou falando apenas de torturas ou mortes, mas também de problemas ambientais, dos agrotóxicos, do impacto das grandes mineradoras. Há casos como o do Chile, onde a lei antiterrorista foi aplicada contra o povo mapuche.

Direitos humanos e democracia são valores indivisíveis. Se os direitos humanos são violados, a democracia se debilita. Estamos trabalhando para tentar uma mudança de comportamento e de mentalidade, mas há muitas consciências armadas com práticas repressivas.

Antes de vir ao Brasil, estivemos no México, país que tem mais desaparecidos que a Argentina na época da ditadura, com governos constitucionais. Em Cidade Juarez, até sairmos de lá, havia a marca de 1.500 mulheres assassinadas por feminicídios. Estamos falando da fronteira com os Estados Unidos. No estado de Guerrero, temos o caso dos 43 estudantes que desapareceram e sobre os quais não há notícia até hoje. Passou um ano e meio e não se sabe absolutamente nada do paradeiro de 43 estudantes. Não estamos falando de uma ditadura.

No México, nos reunimos com o presidente da Comissão Nacional de Direitos Humanos e ele nos relatou as muitas dificuldades enfrentadas para avançar nas investigações sobre casos de violações de direitos naquele país. Há uma situação de terror muito grande. Tanto é assim que o governo dos Estados Unidos emitiu um comunicado recomendando aos turistas norte-americanos para que não viajem ao estado de Guerrero, em especial para Acapulco. Estivemos em Acapulco e os hotéis estão vazios. Claro que, no caso do México, penetrou com muita força o problema da droga, dos carteis do narcotráfico. 

Uma coisa que nós podemos comprovar na América Latina é que as guerras, hoje, são financiadas com a droga. Isso está acontecendo agora no Oriente Médio também. As guerras têm que ser financiadas de algum modo e estão sendo pelas drogas. Por isso, elas não vão desaparecer tão facilmente assim. O narcotráfico está desempenhando um papel sumamente importante hoje na economia das guerras.

Então, quando falamos da realidade da América Latina hoje supomos que todos os governos são democráticos, mas isso não é assim. Veja o caso da Colômbia também, onde agora está prestes a ser assinado um acordo de paz com as FARC. Mas o problema da Colômbia não se resume à relação entre as FARC e o governo de Santos. São quase 60 anos de guerrilha, mas também de narcotráfico, de grupos paramilitares e parapoliciais. O panorama do continente é muito complexo.

Sul21: O senhor está pessimista em relação ao futuro?

Adolfo Pérez Esquivel: Eu sempre digo que sou um pessimista esperançoso. Eu não penso que não há saída para todos esses problemas. Sempre há saídas e possibilidades de mudança, desde que o povo se una.

Na América Latina, as esquerdas estão divididas. A direita tem dificuldades, mas não está dividida porque tem objetivos claros. Mas as esquerdas estão muito divididas na Argentina, no Brasil, em qualquer país. Assim, é difícil construir frentes que possam oferecer alternativas a essa situação da qual falamos. Se o golpe se consumar aqui no Brasil o que vai ocorrer com a população? Estamos aqui acompanhados de movimentos sociais e de grupos comprometidos com a defesa da democracia, mas qual é a força real que têm?

O que me preocupa, no caso do Brasil, são as possíveis repercussões em todo o continente e no mundo inteiro. O Brasil é um país líder, com uma presença importante não só na América Latina. 

Para mim, com tudo o que escutei nestes dias, me parece que o afastamento de Dilma já é praticamente um fato consumado, a não ser que, de última hora, a situação atual possa ser revertida. Mas não é para se desesperar. Sempre há possibilidades de mudanças. 

O fato é que os Estados Unidos seguem trabalhando pela recolonização da região pois necessitam dos recursos deste continente.

Já devastaram a África, que não é um continente pobre, mas é um continente empobrecido. A África tem grandes recursos que estão sendo explorados por grandes corporações. 

Eu participei de uma comissão de investigação sobre a África do Sul e a Namíbia. Durante os oito meses que durou a comissão creio que não dormi em função do que vi, os indicadores de pobreza, o saqueio sem piedade dos recursos destes países. Levamos o resultado dessa investigação à Assembleia Geral das Nações Unidas, onde foram aprovadas sanções que não foram cumpridas.


Postado no Brasil 247 em 02/05/2016





1º de Maio no Anhangabaú em São Paulo : Vai ter luta !











Dilma com o povo aumenta Bolsa em 9%



Refletindo . . .