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O que deu errado com os millennials, geração que foi de ambiciosa a 'azarada'




Qual é a geração Millennial?

Os millennials são definidos pelo Pew como quem nasceu entre 1981 e 1996. Já no caso do Center for Generational Kinetics, de Jason Dorsey, esse intervalo é levemente diferente: entre 1977 e 1995.

A geração Y, também chamada geração do milênio, geração da internet, ou milênicos é um conceito em Sociologia que se refere à corte dos nascidos após o início da década de 1980 até, aproximadamente, o final do século. Wikipédia











O que deu errado com os millennials, geração que foi de ambiciosa a 'azarada'




Qual é a geração Millennial?

Os millennials são definidos pelo Pew como quem nasceu entre 1981 e 1996. Já no caso do Center for Generational Kinetics, de Jason Dorsey, esse intervalo é levemente diferente: entre 1977 e 1995.

A geração Y, também chamada geração do milênio, geração da internet, ou milênicos é um conceito em Sociologia que se refere à corte dos nascidos após o início da década de 1980 até, aproximadamente, o final do século. Wikipédia











A felicidade segundo Zygmunt Bauman



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O filósofo Zygmunt Bauman, morto no último dia 9 aos 91 anos, falou com Valeria Arnaldi, do jornal italiano Il Messaggero, sobre felicidade. Foi uma de suas últimas entrevistas. A tradução é do Unisinos.

Professor Bauman, o que significa hoje “felicidade”?

A declaração de independência americana proclamou, entre os direitos invioláveis do ser humano, a sua busca: um marco para a civilização ocidental. As ideias de felicidade são muitas, mas que podem ser remetidas a duas categorias. A visão mais popular é a de uma vida plena de momentos agradáveis, sem problemas e desafios. A outra nos foi mostrada por Goethe. Já idoso, ele foi perguntado se a sua vida tinha sido feliz. Ele respondeu que sim, mas que não se lembrava de uma única semana em que o tivesse sido. Isso implica que ser feliz não significa não ter dificuldades, mas superá-las.

A atualidade mudou essas visões?

Definir o que significa ser feliz é muito complexo. A própria ideia de felicidade parece conter em si o pressuposto da sua não existência no mundo. A felicidade deve ser conquistada, mas, no nosso sistema de consumidores, vendem-se promessas de promessas de algo que nos fará nos sentirmos melhor. O mercado, em teoria, deveria aspirar a satisfazer todas as necessidades.

Na prática, porém…

Satisfazer os consumidores, na realidade, é o pesadelo do mercado: envolveria não ter mais nada para vender. Os especialistas, portanto, sabem nos manter continuamente insatisfeitos. A publicidade nos promete que seremos felizes com o novo celular, por exemplo, mas ela tinha feito o mesmo para o modelo anterior e vai refazer o mesmo para o posterior. Porém, milhões de pessoas correm para comprar.

O capitalismo está condenado, portanto, à infelicidade?

A atitude do sistema encoraja a ideia de que há algo que pode resolver todos os problemas e alimenta constantemente tal convicção. Isso torna os momentos de felicidade muito curtos. O problema é que somos constrangidos a gastar o dinheiro que ainda não ganhamos para comprar coisas das quais não precisamos para impressionar pessoas que não nos importam muito. Esse é o caminho para alongar os momentos de infelicidade.

É preciso repensar o nosso modo de nos imaginarmos satisfeitos?

É preciso redescobrir o prazer de comunicar. Eu não me refiro aos tuítes, mas a conversas de verdade. Há uma grande diferença entre encontros virtuais e tradicionais. Para voltar aos acontecimentos ao estilo antigo, cada um deveria diminuir as suas próprias demandas, mas o mercado tenta levantar as expectativas e faz isso nos forçando a pensar, desde crianças, que cada momento de felicidade deve ser melhor do que o anterior. Cada instante desperdiçado é uma chance de felicidade perdida.

A sociedade líquida ainda é capaz de ser feliz?

A ideia da sociedade líquida é de que nada permanece por muito tempo. Vivemos em um mundo de constante novidade, em que envelhecemos cada vez mais rápido do que antes. Estamos em um espaço vazio. Gramsci definiu essa situação como um interregno em que as velhas regras desapareceram, e as novas não foram inventadas. Isso gera ansiedade.

E para que cenários a ansiedade nos leva?

Quando eu era estudante, os professores diziam que aprender nos torna mais ricos. Eu acho que a cultura contemporânea não está mais fundamentada na capacidade de aprender, mas de esquecer. Para aprender outros conceitos, você deve eliminar os velhos. A maior qualidade seria, por isso, a habilidade de esquecer. Na Itália e na Espanha, vê-se menos isso. Na França, Alemanha, Inglaterra, a questão é evidente e é uma reação ao medo.

A crônica nos revela que muitos gostariam de respostas mais duras por parte da política: o medo está criando espaço para o retorno de regimes fortes?

Estamos voltando 200 anos atrás nas lutas por democracia e liberdade. Agora, desejam-se mais regras. Segurança e liberdade são valores fundamentais para a dignidade humana. A segurança sem liberdade é escravidão. A liberdade sem segurança é um tipo de deficiência. As pessoas, por séculos, procuraram equilibrar as coisas, e isso não funcionou. Cada passo em frente para a liberdade requer que se renuncie a uma parte da segurança. Cada passo rumo a uma maior segurança envolve renunciar a um pouco de liberdade. Não há um caminho direto para ter cada vez mais de uma ou da outra. É um pêndulo que oscila, empurrando para a mudança.

Hoje, oscilamos para a segurança.

Muitas pessoas, em diferentes partes do mundo, parecem ir na direção da renúncia a mais liberdades em favor da segurança, desejando uma situação mais estável. É a tendência atual. Ainda estamos em uma sociedade líquida, mas em que nascem sonhos de uma sociedade menos líquida.



Postado em Diário do Centro do Mundo DCM em 11/01/2017



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Internet e as interações sociais



Livro Aberto 27/05/13 - com Alex Primo



Um homem para chamar de seu




Rodolpho Motta Lima

Penso que um dos grandes embrulhos ideológicos do pessoal da direita passa pela sua absoluta convicção de que o individual vale mais do que o social. Essa tese despreza o coletivo como agente, mas adora vê-lo como paciente - alienado e inerte. 

A direita cultua personalidades, valorizando os “que se fazem por si mesmos”, os “empreendedores”, os “que fazem diferença”. Ela precisa disso para justificar os bilionários, os especuladores, os banqueiros e todos os que, no mundo do capital, são apresentados como pessoas únicas, diferenciadas, até beneméritas. Afinal, o que seria desse bando de empregados sem essa elite de empregadores?

Na ânsia de se promover o sucesso individual a uma categoria paradisíaca, não raro se elevam nulidades à condição de mitos, privilegiando – bem ao gosto dos tempos que correm – narcisismos e egocentrismos, que fogem do social como o diabo, se existisse, fugiria da cruz...

Acontece que os ídolos, esses super-heróis que povoam os noticiários do cotidiano, podem ter – e não raro têm , porque sua natureza é humana – momentos de “pés de barro”. Aí, é preciso um esforço incrível da turma para desconstruir o que construiu, às vezes com sofismas, meias verdades, manipulações e omissões. 

Quem conhece bem a história recente da terra do Super-Homem, do Batman, do Homem-Aranha, do Homem de Ferro, do Indiana Jones, do Rambo, do Rocky e similares sabe das alianças que o império estadunidense manteve , ao sabor de conveniências econômicas, com diversos ditadores que, não mais que de repente, de grandes líderes mitificados foram transformados em agentes do mal. Para ficar apenas em dois exemplos marcantes, é só estudar a trajetória de um Saddam Hussein , de um Bin Laden, e suas ligações com os EUA.

Quando estava pensando nesse tema, me veio à lembrança uma canção entoada pela Marina (a cantora, não a Silva) e de autoria do Erasmo Carlos, chamada “Mesmo que seja eu” ( Veja o vídeo ) O contexto da letra da composição nada tem a ver com meu assunto aqui, mas um dos seus versos (“Um homem pra chamar de seu”) me pareceu um bom título para este artigo. 

A direita, nacional ou planetária, precisa sempre de um homem – às vezes uma mulher – para chamar de seu (sua). E é tal essa sua “crença”, que mitifica a torto e a direito. 

A ironia é que faz isso até para denegrir. Entre nós, ela quer que se acredite que o Brasil recente só trilhou os caminhos que trilhou porque um homem cheio de defeitos , mas “carismático”, conduziu os brasileiros. 

Não acredita em forças sociais. Por isso, atribuiu à Dilma (que não tinha “carisma”) a condição de “poste”, e está se dando mal, pois o que o povo valoriza hoje no país, queiram ou não, é muito mais uma política voltada para o combate às injustiças , mesmo com eventuais desacertos, do que esta ou aquela personalidade. Os índices de popularidade da Presidenta vêm de um continuado trabalho de muitos e que atende a anseios coletivos, mas nunca do exercício solitário de um comando.

A direita repete, agora, esse mantra do “poste” no caso da Venezuela. Convenientemente cega diante dos índices de redução das desigualdades naquele país, atribui o “bolivarismo” ao fato de um “populista demagogo” ter empalmado o poder. Para ela, não há conquistas a garantir, o povo é uma abstração, e como Maduro não é um Chávez, será fácil à turma do capital recuperar o comando. Será? É o que vamos ver. Nada como os fatos para contrariar os desejos...

A “metodologia do endeusamento” adora criar falsos heróis, amplificados pela mídia, para esconder o sistema que os cerca ou que eles representam. 

É por isso que as eleições na pátria do individualismo, por exemplo, não se definem pelas ideias , mas pelas pessoas. Uma cara simpática, uma família bonita e aparentemente bem constituída, coisas assim elegem presidentes... 

E aí está Obama - cheio de aparentes boas intenções, mas imobilizado por forças bem superiores às de um indivíduo - que até agora não foi para frente nem pra trás, muito pelo contrário... 

O caso da eleição do Papa é emblemático. Como não consegue , ou não quer conseguir, enxergar o estrutural, o coletivo, a mídia que representa esse pensamento repercute, amplia e supervaloriza os mais simples atos do novo mito, para muitos um jogo para a plateia alienada, como ensina a boa e velha demagogia. 

É como se quisessem impregnar nas mentes a ideia de que, agora sim, temos (?) Papa... Mas será que um homem (falível ou infalível, não entro nessa) conseguirá, com suas quebras de protocolo, reverter os tortuosos caminhos de uma Igreja que tem, hoje, muitos de seus mais altos representantes envolvidos em diversos pecados capitais? Implantará a “ficha limpa” no Vaticano? Estão aí, nesse festival de “malfeitos” que hoje não dá mais para esconder, escândalos de luxúria (pedofilia), ganância (Banco do vaticano), inveja (disputas pelo poder), etc.

A direita assanhada já tenta emplacar o novo Papa como “um homem pra chamar de seu”. 

Imagina-o como contraponto ao que chama de “governos populistas”. Acho que, para variar, está dando um tiro no pé. O ídolo pode ter os pés de barro. Outros, que ocuparam o seu posto, já tiveram... 

Muitas mudanças já se fizeram na Igreja...para deixar tudo igual. E aí se desconstruirá mais um mito. Mas, por outro lado, pode ser que o simpático Papa resolva efetivamente fazer com que a Igreja se volte para os pobres do mundo. Se isso acontecer, ele não poderá jamais trilhar o mesmo caminho dos adoradores do mercado, dos especuladores, dos exploradores do povo. 

E a direita terá que buscar, mais uma vez, um representante para chamar de seu...


Postado no site Direto da Redação em 25/03/2013


Raça é racismo, preconceito é elitismo e a violência é contra todos




”A única obscenidade que conheço é a violência”.
(Jim Morrison – 1943/1971).

Por Davis Sena Filho 


   Todos nós sabemos que o Brasil é um País injusto, com enorme concentração de renda, de terras e com uma história cruel de exclusão social, no que concerne ao acesso da população brasileira ao ensino, à saúde, à moradia, à terra e ao emprego. 

   Essa situação se eterniza no nosso País porque não convêm às classes dominantes, que controlam as áreas econômicas, políticas, acadêmicas, científicas, além dos setores ligados à segurança do estado nacional, democratizar e distribuir as riquezas e o conhecimento que as instituições privadas e estatais adquiriram através do tempo, em 511 anos de história desse País.

   O Atlas elaborado em 2003 pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) denuncia e aponta mazelas sociais e econômicas graves que oprimem e retiram o direito à cidadania plena da população brasileira formada por cidadãos negros e pardos. É lamentável e vergonhoso que pequena parte da sociedade brasileira, que controla os sistemas de produção, financeiro e principalmente de comunicação, além de milhões de hectares de terras, não tenha chegado à conclusão que enquanto houver exclusão social e econômica a ditar a rotina de vida dos brasileiros haverá sempre espaço para a perpetuação da miséria, da ignorância, da prostituição, do tráfico de drogas e de armas, da violência e da banalização de homicídios.

   Não é possível também que os estados brasileiros, por intermédio de seus governos, não efetivem, com a celeridade necessária, políticas públicas que ajudem a conter, com urgência, o momento caótico, de degradação moral, pelo qual passa a sociedade brasileira, que, refém da criminalidade e ainda da miséria, não sabe a quem recorrer e nem a quem pedir proteção, porque no Brasil a Justiça tarda e falha. 

   A taxa de homicídios no Brasil, no período de 1992 a 2007, cresceu 32% em 15 anos, conforme pesquisa IDS 2010 (Indicadores de Desenvolvimento Sustentável) divulgada pelo IBGE. Em 2007, de acordo com o IDS, a média foi de 25,4 mortes para cada 100 mil habitantes, enquanto em 1992 o índice ficou em 19,2 mortes. No ano de ano de 2008, a média foi similar.




   O estudo indica ainda que cerca de 47 mil pessoas foram assassinadas no Brasil. A grande maioria das vítimas era negra. Os Estados Unidos, durante 13 anos de guerra no Vietnã, perderam 54 mil soldados. Portanto, temos em nosso território uma guerra muito mais cruel e sanguinária, verdadeira guerrilha urbana e rural, despida de ideologias, mas solidificada no desejo de consumo e na vontade de auferir lucro e vantagem, mesmo se o lucro for de natureza ilegal.

   Nós vivemos a apologia “do ter” e não “do ser”. O mercado, a publicidade, a propaganda e o marketing apregoam que o cidadão somente será aceito ou terá sucesso se ele comprar, usar, beber ou comer os produtos por eles inventados e fabricados e vendidos nos balcões de negócios em que se transformaram os meios de comunicação — porta-vozes do sistema de mercado massificado. 

   É a ditadura da futilidade, da leviandade, do engano e da mentira. É a indústria do que é, efetivamente, descartável, porém, com o tempo, cara para sociedade, que “entra de cabeça” nesse engodo, por não se preocupar com as coisas que realmente edificam o desenvolvimento humano, que é a cultura, o ensino escolar de base e universitário, a saúde e o acesso universal aos serviços públicos, de preferência de boa qualidade. O restante vem depois, sempre vem, quando uma civilização se torna mais homogênea, quando as diferentes classes sociais diminuem as desigualdades, as contradições e os antagonismos.

   Os nossos garotos se matam entre si, enfrentam a polícia e quem mais tiver de enfrentar para ter status, namoradas, o tênis da moda, o carro “oferecido” pela publicidade, a bebida do sucesso, além das roupas e cosméticos que os meios de comunicação garantem que são o máximo. A questão é de auto-afirmação em relação à comunidade em que vivem, bem como a quase total ausência de valores morais, familiares, educacionais e religiosos.




   Vazios de princípios pétreos, como trabalhar, estudar, respeitar o semelhante, ser cidadãos honestos e lúcidos e dignos entre seus contemporâneos, muitos de nossos garotos preferem transitar por veredas tortuosas, sendo que a maioria delas não leva a lugar algum — a não ser ao abandono social e familiar, cujo destino é a cadeia, se tiver a sorte de não parar no cemitério. 

   Entretanto, faço uma ressalva: a enorme parcela dos garotos que são acusados e processados pelo estado de transgredir as leis, as regras e cometer crimes de modalidades diversas têm origem humilde, são filhos de famílias carentes, e, por ser pobres, geralmente são indivíduos de etnia negra ou parda.

      Essa realidade existe porque a maioria dos criminosos brancos não usa armas para roubar ou matar. Os criminosos brancos têm como armas a caneta, a força política e econômica, o poder de influência na Justiça, no Legislativo, no Executivo e na polícia — em todas as polícias. O criminoso branco geralmente estudou e tem bons e caros advogados, que são pagos, regiamente e fartamente, com o dinheiro cuja origem é a corrupção estatal associada à iniciativa privada, além do roubo de mercadorias, da manipulação da gasolina e do álcool, das licitações fraudulentas, do roubo de carros e caminhões e, como não poderia deixar de ser, tal qual acontece com os negros das favelas, do tráfico de drogas e armas.

   Neste último caso, o criminoso branco não troca tiros com grupos rivais ou com a polícia, porque ele somente atua no atacado. O varejo fica para os negros, que defendem seus territórios por meio do enfrentamento à bala. O criminoso branco não se expõe, porque tem recursos e meios para isso. As palavras até agora escritas me levam a afirmar que a violência, o racismo e a pobreza são irmãos siameses. São unidos umbilicalmente. Um é resultado de outro; é conseqüência. E sempre foi assim, desde o início da humanidade. Por isso, que a criminalidade tem de ser combatida, por intermédio também da repressão do estado, mas, principalmente, por meio da melhoria das condições de vida das pessoas que vivem à margem da sociedade e abaixo da linha de pobreza.

   Repressão, por si só, não acaba com a miséria material e com a miserabilidade humana. Criminoso tem de ser preso, seja ele rico ou pobre, mas os políticos, os economistas, os sociólogos, os professores, os jornalistas e os administradores, se forem sensatos e inteligentes, saberão compreender que a miséria é a mãe do crime e da degeneração social e moral.




   O estado pode prender cem, mil; prende-se um milhão de pessoas, mas é imperativo realizar a distribuição de renda e de terras. Equacionar os impostos, criar empregos, diminuir os tributos e exigir um novo reescalonamento das dívidas públicas, principalmente a interna, porque a externa atualmente é praticamente da iniciativa privada e ela que arque com suas responsabilidades. E o estado nacional que a deixe arcar, porque os empresários apoiaram o neoliberalismo e portanto, que paguem por seu erro.

   O contribuinte tem de exigir serviços públicos de boa qualidade do estado e o estado tem a obrigação de atender as pessoas que dele necessitam, e, obviamente, os empresários não fazem parte desse grupo que depende da atenção do estado. Além do mais, o grande empresariado admira e prega a frase “quem não tem competência não se estabelece”. 

   Então que ele faça jus ao slogan e não procure o estado quando fracassar, atitude que todos nós sabemos que nunca acontece, como ocorreu na Europa e nos EUA, a partir da crise iniciada em 2008, quando os estados nacionais tiveram de socorrer a incompetência e a irresponsabilidade dos empresários, e a falta de regras regulatórias para fiscalizar e punir os diversos mercados, além de cobrar a leviandade da imprensa privada (privada nos dois sentidos, tá?) e de seus “especialistas” de prateleira, que caíram com seus burros n’água, por causa do derretimento do neoliberalismo, que eles defenderam até se afogar na própria irreflexão, insensatez e má-fé.

   Para isso, o Governo precisa ter coragem, disposição e, por intermédio desse processo, levantar recursos para combater a criminalidade, a ignorância e a miséria. Isso pode ser feito e está a ser realizado. Só não vê quem não quer, talvez por ideologia, preconceitos ou simplesmente ignorância. Ou talvez estivesse em um processo de coma durante dez anos e depois acordou e por isso não percebe as mudanças que aconteceram na última década no Brasil. Uma verdadeira revolução, que ocorreu sem repressão aos movimentos sociais e às instituições e entidades públicas e privadas. 

   Sem repressão contra o povo brasileiro. Porque os números econômicos e financeiros e sociais estão aí, para quem quiser ver, analisar e estudar. Instituições e órgãos como IBGE, BC, Receita, Fazenda, Tesouro, BB, CEF, Sudene, Sudam, BNDES, PNUd e Unicef estão abertos para quem quiser pesquisar os números econômicos e os índices sociais do Brasil e de seu povo. Compete a quem duvida ir atrás desses números.




   Muitos dizem que as coisas são complexas e demandam tempo e dinheiro. Mas quem afirma esse tipo de coisa, esse despropósito, é porque não quer mudanças. Na verdade, quer manter os privilégios, ou até mesmo, por ignorância ou conservadorismo, não consegue compreender, com precisão, o que está a acontecer no Brasil — a sétima maior economia do mundo, aceite ou não a direita partidária urbana e rural e a imprensa comercial e privada (privada nos dois sentidos, tá?). 

   Todavia, sei de uma coisa: apesar de reconhecer, e muito, que o Brasil avançou espetacularmente no Governo Lula, permanece ainda no fundo do meu coração o sentimento de que o País ainda não é confiável para as gerações vindouras, que poderão (a gente nunca sabe) ficar igualmente expostas ao que a minha geração, infelizmente, está cansada de ver: violência, pobreza, impunidade e os 10% mais ricos do País a concentrar 75,4% da riqueza produzida pelos brasileiros, conforme pesquisa do Ipea de 2010.

   Caro leitor, o Produto Interno Bruto (PIB) mostra as riquezas do País, enquanto o Índice de Desenvolvimento Econômico (IDH) mostra a pobreza. Evidentemente, o IDH é o índice que deveria pautar e dar direcionamento de pensamento aos nossos economistas e administradores, governantes e empresários e meios de comunicação, para que pudéssemos desenvolver e pensar o Brasil, e, conseqüentemente, melhorar as condições de vida do povo brasileiro, se o capital e os mercados, repetidamente, com a cumplicidade de governos, principalmente os de perfis neoliberais, que foram derrotados nas urnas na América Latina, não dessem prioridade às demandas e aos privilégios dos ricos que controlam a macroeconomia.

   Observemos o que está a acontecer na Europa, no Japão e nos EUA. É o mundo real. É a face dura das sociedades quando falta salário e emprego. Os conflitos se multiplicam, porque “quando falta pão todo mundo grita, mas ninguém tem razão”. Principalmente os governos que se aliaram aos empresários e faliram seus países, e depois querem resolver os problemas com repressão policial.




   Besta é o policial que entra nessa, porque ele faz parte da classe trabalhadora. É bom lembrar. Por isso, não dá, não é de boa monta acreditar, por exemplo, na Globo News e em suas co-irmãs, bem como nos “especialistas” de prateleira, que defendem o indefensável; justificam o injustificável e pregam o que não é mais ouvido — escutado.

   Contudo, e com a realidade a nos dar quase todo o dia um soco no estômago ou um tapa na cara, à escolha, o sistema prefere manter os privilégios das classes abastadas, com o apoio da classe média universitária, conservadora, porém despolitizada, mas empregada nas empresas dos que controlam os meios de produção e os poderes constituídos. “Distribuir riqueza e renda, nunca!” É assim que pensam partidos como o PSDB e o DEM e certas entidades empresariais. 

   É dessa forma que agem os colunistas, editorialistas e comentaristas brancos e de classe média alta da imprensa corrupta e manipuladora quando não mentirosa. O preço é alto, porque os filhos dos ricos também terão uma vida de privações, pois ficarão exilados, desterrados em seus condomínios e enjaulados dentro de suas casas, como já acontece nos bairros de classes A e B das grandes e médias cidades.

   Viveremos em um País, se não dermos continuidade à distribuição de renda e de riqueza, além de continuarmos a efetivar a ampliação dos programas sociais, em que a liberdade de ir e vir será apenas um artigo da Constituição da República Federativa do Brasil. A questão da violência, da pobreza e do racismo está intrinsecamente ligada aos 350 anos de escravidão e à concentração de renda e de terras. 
   Para complementar o que foi dito até agora, necessário se faz salientar que o relatório divulgado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) mostra que de 1982 a 2003 a proporção de negros entre os pobres e indigentes do Brasil praticamente não teve alteração. Observe-se que, 21 anos depois, as elites brasileiras, herdeiras dos senhores de escravos, não cumpriram com suas responsabilidades e obrigações, mesmo após a redemocratização do País.




   Como em 1982, o percentual de negros em 2003 entre os pobres se manteve em 65% e entre os indigentes o percentual se manteve em 70%. Para o demógrafo Eduardo Rios Neto, do Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional (Cedeplar) da UFMG, um dos autores do Atlas do Pnud, a raça é a dimensão estrutural da pobreza e da indigência e por isso é a questão mais difícil de solucionar. 

   O demógrafo disse ainda que mesmo quando houve planos que distribuíram alguma renda, como o Plano Cruzado de 1986, a situação social e econômica da população negra não melhorou. Rios Neto afirmou na época que a pobreza não é exclusiva dos negros, mas aparece em suas vidas com maior intensidade.

   O Atlas informa que brancos e negros de mesma escolaridade não recebem salários iguais. A renda dos negros é menor, uma prova inquestionável de que a discriminação racial explica e reflete as desigualdades no nosso País. A desigualdade, entre cidadãos brasileiros, retrata, cristalinamente, o racismo nas relações de trabalho no Brasil e, por conseguinte, em todas as relações sociais. 

   O racismo aprofunda as desigualdades e a sociedade brasileira o institucionalizou, bem como o estado, no decorrer dos séculos. Outro fator que colaborou para a situação da população negra não ser condizente com sua importância como trabalhadora e por isso geradora de riquezas é sua condição de escrava no passado.

   Por quase 350 anos a economia teve como base a escravidão, de forma oficial, o que prejudicou, sobremaneira, os descendentes de afro-brasileiros, que, como seus antepassados, não tiveram acesso a terra e por isso tiveram de ocupar os morros e as periferias, onde hoje acontece toda modalidade de crime, apesar de programas vencedores como o que implantou as Unidades de Polícia Pacificadora (UPP) no Rio de Janeiro e do aumento dos recursos oriundos do Governo Federal, com o apoio logístico e de pessoal dos governadores dos estados federados para reprimir e combater a criminalidade, com o auxílio importante da oferta de serviços públicos, de implantação de infraestrutura (pavimentação e esgotamento sanitário) e de ampliação dos benefícios sociais, exemplificados no Bolsa Família, no Bilhete Único e na construção de casas, por intermédio do Minha Casa, Minha Vida, entre outros programas e benefícios.


O ritual de queima da cruz foi o primeiro a ser realizado em público em 50 anos
Foto: Reuters - 24/10/2010


   Além do mais, os negros não tiveram acesso à saúde de boa qualidade, o que faz com que essa importante parcela da sociedade brasileira tenha, em média, cinco anos de vida a menos que a parcela branca. Quanto à educação, o homem e a mulher negros estudam em média entre quatro a seis anos a menos. Este é o nosso País, onde moram pessoas que mesmo a conhecer realidades, índices e números preferem ficar presas em condomínios e carros blindados do que apoiar a desconcentração de renda e a distribuição de terras, bem como propiciar a divisão das riquezas produzidas pelos trabalhadores, brancos e negros e de todas as origens étnicas, porque o Brasil é um País de imigrantes e de índios. Todo cidadão brasileiro tem direito a viver em paz e em segurança.

   A questão da erradicação da pobreza ou da miséria é tão importante quanto à inserção, à inclusão dos negros brasileiros na sociedade. A maioria dos pobres é negra. Não se pode esquecer essa indubitável realidade. Até porque, como bem sabemos, existe somente uma espécie: a espécie humana. Definição de raça é racismo. Preconceito é elitismo. E a violência é contra todos. É isso aí.


Postado no blog Palavra Livre em 04/06/2012

Marilena Chauí sempre muito esclarecedora !


Marilena Chauí e a classe média: “Como se o mundo tivesse posto em risco todos os seus valores”



Na terça-feira 28, o Coletivo dos Estudantes em Defesa da Educação Pública realizou, na Faculdade de Ciências Sociais da USP, o debate A ascensão conservadora em São Paulo. A filósofa e professora foi uma das debatoras. Abaixo a fala dela no evento.




Postado no blog Viomundo em 30/08/2012

O Brasil é afetivo, encantador, violento e tenebroso


    
Maria Rita: "Basta a imprensa ignorar e a polícia
intimidar que o assunto não existe" - Foto: UFM








Para Maria Rita Kehl, o importante é que quem está se mobilizando tenha inteligência política suficiente para saber que pontos políticos podem mobilizar. 
















Áurea Lopes 
Dois pesos: a psicanálise e o jornalismo. Foi a partir dessa parruda união de forças e percepções que Maria Rita Kehl produziu as crônicas de sua mais recente obra, entre muitos escritos em outros livros e jornais – incluindo o artigo que resultou na escandalosa suspensão de sua coluna no jornal O Estado de S. Paulo por ter defendido políticas do governo Lula, quando o jornal (que faz campanha contra a censura) apoiava o candidato à presidência José Serra.
“Eu até gostaria de fazer crônicas mais literárias, mas os temas da atualidade acabam me roubando... e é pra isso que eu vou”, diz a intelectual, que nesta entrevista exclusiva ao Brasil de Fato fala sobre “as dores do Brasil”, eixo agregador dos temas abordados em "18 crônicas e mais algumas", publicação da Boitempo Editorial lançada em novembro.    
Indignada com o descaso dos governos e a indiferença da população diante das mazelas sociais (“restos não resolvidos de 300 anos de escravidão”), Maria Rita fala sobre o engajamento dos jovens nas lutas populares (“ainda é pouco”), a violência policial (“resultado de uma ditadura que termina impune”) e afirma que os recursos para aplacar as dores do país estão na militância: “É hora de fazer política”.      
Brasil de Fato – Uma frase que do seu último livro que chamou muito a atenção e teve grande repercussão foi “O Brasil dói”. A pergunta inevitável é: quais as dores do Brasil que você considera mais preocupantes? 
Maria Rita Kehl – Bem, não que seja uma frase genial, ao contrário, acho até banal. Mas talvez tenha chamado tanto a atenção porque corresponda ao sentimento de muita gente. A dor que o Brasil sente eu já intuía, mas aprendi com o meu ex-companheiro, o historiador Luís Felipe Alencastro, que é um estudioso da escravidão no Brasil. Uma parte do que se chama de um difuso mal estar tem a ver com os restos não resolvidos politicamente de 300 anos de escravidão. Quer dizer, não há explicitamente uma política de segregação no Brasil, mas nunca houve uma abolição, de fato. A abolição se deu porque economicamente o sistema já estava falido.      
A escravidão acabou assim, com miséria, com os escravos chutados dos lugares, ganhando subsalários. Mas não houve nada para proteger essas populações, que foram jogadas nas ruas, sem trabalho, sendo tratadas do mesmo jeito que antes porque a cor da pele não muda... e marcou durante décadas os escravos. Demorou muito para o negro ser visto como um trabalhador livre, como qualquer outro. E mesmo hoje, acho importantes as políticas públicas feitas no governo Lula e no governo Dilma, mas embora não haja preconceito explícito, que agora é ilegal, há, sim, diferenças.  
Outra coisa que dói, para pegar aquilo que me atinge, é a forma como a ditadura militar acabou. Igualzinho. De repente acabou, porque estava inviável mesmo... e não tem reparação, não tem investigação, julgamento de quem torturou, de quem matou... crimes de Estado ficaram impunes. Hoje há um movimento mais importante para tentar fazer alguma coisa, com muito esforço, conseguiu- se uma tímida comissão da verdade. Mas a indiferença da população é enorme. E dói também o desamparo de uma parte da população, quando tem inundação, quando desaba um morro... e você vê o modo como a verba pública é desviada, os mistérios não cumprem suas funções.... é isso que dói.        
Como essas “dores” atingem, em particular, os jovens? Quais as perspectivas de futuro para que as novas gerações mudem esse cenário? O acesso à educação aumentou, mas e as oportunidades de trabalho? 
Pelo que eu vejo nas minhas viagens pelo país, o ProUni (Programa Universidade para Todos) – que foi tão criticado, as pessoas diziam que o governo estava fazendo a privatização do ensino, o que não é – abriu uma perspectiva enorme. Em 2008, por exemplo, eu viajei por uma região do rio São Francisco. Todo mundo que a gente conversava tinha um parente na universidade ou estava na universidade. Isso quer dizer que o cara vai ser um doutor, contratado por um alto salário de uma companhia? Não. Mas significa que a visão de mundo dele vai melhorar, o status dele para emprego vai melhorar. Se vai ter emprego, ou não, não dá pra saber. E o mais importante é que isso revela um interesse desse jovem pelo estudo. Eu lembro, em Barra de São Miguel (AL), o garçom dizendo “eu quero estudar história e meu irmão, filosofia”. O que isso vai melhorar na renda dele de garçom? Não tão grande coisa. Mas a visão de mundo será outra. Então, eu acho que melhorou, mas ainda falta muito.       
Como você a participação política dos jovens, hoje? 
Acho que hoje há um distanciamento. Como havia antes. Na época da ditadura, a gente pensava que todo mundo estava dentro porque a gente estava dentro. Mas era uma minoria de estudantes, uma minoria de militantes. Eu acho, por exemplo, que o MST é o único movimento que atrai os jovens, hoje, inclusive os de classe média. Os partidos não atraem, a política não atrai, a política estudantil está tendo agora um crescimento, que eu acho importante, mas está minguada, comparando-se ao que já foi. Então, tem gente que diz que o jovem de hoje não está interessado em mudar o mundo. Não parece. Uma porção de jovens de classe média apoia o MST, milita, vai trabalhar lá... até mora embaixo da lona preta.            
É como na minha geração. Claro, os estudantes estavam nas ruas... mas quem foi lutar? Uma minoria. As pessoas estavam adorando que o Brasil estava se tornando uma sociedade de consumo. A grande maioria, enquanto teve o milagre brasileiro, estava indo para os shoppings.        
Talvez o que aconteça hoje, como não existe a ditadura, é que os jovens se envolvam em vários tipos de militância. A militância ecológica agrega muita gente. E não que eles tenham uma visão de esquerda, anticapitalista, revolucionária... talvez não tenham. Mas eles estão interessados na discussão política do meio ambiente. Porque está mais perto, é mais fácil de compreender, exige menos debate teórico, não sei por quê... mas esse é um campo de militância do jovem. Assim como as lutas pelos direitos individuais, antirracistas, por reconhecimento de homossexuais... Agora, essas lutas são fáceis do capitalismo absorver. A luta anticapitalista no Brasil ainda é confusa. O MST é uma exceção. Nessa crise, por exemplo, um grupo de estudantes acampou no Anhangabaú (Vale do Anhangabaú, no centro de São Paulo), tentando fazer algo como o que aconteceu em Wall Street, nos Estados Unidos. Mas aqui não tem efeito nenhum. Basta a imprensa ignorar e a polícia intimidar que o assunto não existe.       
E não precisa muito para a polícia, principalmente a de São Paulo, “intimidar”. O que significa: partir para a pancadaria?      
Olha, não existe mais um Doi-Codi aqui em São Paulo. Mas a polícia paulistana é tão violenta quanto. Mata, tortura e há uma indiferença da sociedade em relação a isso. Esse movimento que houve agora na USP não era, como muitos colunistas de jornal falaram, um movimento de jovenzinhos mimados. Eles estão lutando contra a falta de direitos. É confuso, evidente, porque não ter polícia no campus é controverso, pois teve até assassinato lá... Mas a questão é o modo como a polícia age. Não tem uma passeata que não seja dissolvida com porrada, gás de pimenta, cassetete... São Paulo, nesse ponto, é o estado mais conservador do país. E o que me assusta é que a violência é grave e a sociedade fica indiferente. No período militar, tinha uma parte da população que era indiferente também. Tinha uma parte que até apoiava a violência, achava ótimo que apanhassem os comunistas. Mas também tinha uma parte que não apoiava a violência, que não estava indiferente, mas que tinha medo. Hoje não é pra ter todo esse medo de se manifestar. Tudo bem, a polícia pode chegar, jogar gás de pimenta... mas pouca gente se manifesta. Na última passeata na avenida Paulista, não sei se foram uns 3 mil estudantes, mas é pouco. Podia ter uma passeata de 50 mil.        
A violência – e a indiferença da sociedade – são mais marcantes no campo, onde a luta de classes é mais selvagem? 
A região do agronegócio é um assunto à parte. No livro O que resta da ditadura, uma série de ensaios publicados pela editora Boitempo – esse livro vale ser citado, o leitor que puder deve ler – faz uma análise exatamente disso. Como uma ditadura que termina sem nem um tipo de investigação, de punição, deixa muitos restos. Tem um dado de uma pesquisadora estadunidense que diz que o Brasil, de todos os países que passaram por uma ditadura na América Latina, é o único onde a violência policial aumentou, em vez de diminuir. Só que não é mais contra estudantes, não é mais contra supostos subversivos... é contra pretos, pobres, favelados, contra gente fumando maconha, é o cara do exército que se acha desacatado pelo menino do morro...    
A violência de classe no Brasil sempre existiu. Sérgio Buarque de Holanda nos mostrou o que os donos dos escravos faziam dentro de suas terras, por conta própria, a crueldade com os escravos... e a polícia não entrava. O fazendeiro, o senhor de engenho, dentro do seu pequeno feudo, fechado, era rei, policial, juiz. E o Estado não invadia, por uma questão de conluio. O pacto de classes no Brasil colonial e pós-colonial permitia, por exemplo, que o pai de família rural prendesse a filha desvirginada no quarto pro resto da vida... Sem falar nas revoltas populares que foram massacradas durante o período pré-independência. E a gente aprende na escola que a independência se deu sem sangue, dom Pedro lá, bonitinho, no cavalo... Por isso que eu coloquei no meu livro que o Brasil é afetivo, encantador, violento, tenebroso.    
A que causas você atribui o aumento da violência? 
Eu não sei analisar se a violência está aumentando. O que me preocupa mais, como disse, é a indiferença das pessoas em relação à violência. O que talvez esteja mais acentuado, e eu acho que isso tem a ver com os apelos da sociedade de consumo, é a violência dita banal. A violência que tem a ver com o jovenzinho que para no farol e começa a disputar com o outro quem põe o som mais alto, e acaba em racha, e acaba em tiro... e atropela gente que não tem nada a ver com isso. A violência do sujeito que acha que para se incluir tem de ostentar algum tipo de poder que lhe é conferido por uma mercadoria. Então ele pode matar para roubar um tênis, ou, quando ele consegue um carro, tem que ir até o limite de velocidade e arrisca as pessoas, não agüenta um pequeno confronto de trânsito e já sai para brigar. É o modo como nós estamos cada vez mais definindo quem nós somos, a nossa qualidade humana, pelas mercadorias e as disputas que isso promove.         
E olha que interessante... no tempo do império, a segregação pelos signos de poder era tremenda. A roupa que cada um podia usar, o tecido que podia comprar, se andava de carruagem ou de cavalo... Ou seja, a segregação pelo que você pode ter existe em toda sociedade de classes. E talvez já tenha sido até mais forte. Muito poucos podiam ostentar ou desfrutar de benefícios e privilégios e a maioria não desfrutava nem de direitos. Os direitos estão se expandindo.     
Inclusive o direito a integrar a sociedade de consumo. 
Isso é curioso. Há um ponto includente, na sociedade de consumo. Por exemplo, a não ser que seja um garoto que só compra roupas de marcas importadas, não tem muita diferença entre o que usa um filho de família de classe média e o filho da empregada dessa família. Essas evidências eram muito mais fortes antes, havia menos mercadoria quando as roupas eram muito caras. Talvez por isso é que as pessoas briguem com mais violência por aquilo que as distingue. O filhinho de papai porque tem outro cara com um carrão e ele quer se sobressair. Ou o jovem de classe C, que pode comprar seu primeiro carro, e de repente acha que pode sair perseguindo os outros... Eu digo carro porque, dentro da sociedade de consumo, a propaganda de carro eu acho um horror! Na propaganda de bebida, o máximo que pode ter de segregação é: você comprou a marca X porque não sabia que a marca Y era melhor, então você é um otário. Mas a cerveja qualquer um tem dinheiro pra comprar. Agora, o carro... o cara passa com o carro e todo mundo fica babando a pé... o flanelinha disputa com o outro o direito de guardar o carro do playboy... o cara adora provocar inveja... o carro lhe basta, o mundo pode estar caindo lá fora... é o máximo da convocação para você não ter nenhum tipo de solidariedade com ninguém.    
Uma apologia ao individualismo? E, daí, a indiferença em relação ao coletivo? 
Um pouco isso. Mas temos de ver que o individualismo tem suas vantagens. Por isso eu não usei essa palavra. Por exemplo, o individualismo que tem a ver com liberalismo eu acho que traz ganhos mesmo na sociedade pós-capitalista, que eu não vou chamar de comunista, mas talvez de socialista, no sentido amplo. Eu espero que esses direitos individuais não se percam. Nós, que somos mulheres, sabemos os ganhos que tivemos com o individualismo. Que cada um possa escolher seus destinos, que cada um possa fazer suas opções sexuais, decidir se vai formar família ou não, que se possa ser mãe solteira, ser mãe por inseminação artificial, não ser mãe... sem ser a escória da sociedade! Que gente rica possa escolher trabalhar com o MST ou ir para comunidades indígenas na Amazônia. A riqueza das diferenças individuais é um ganho do capitalismo liberal, que a gente chama de individualismo. Ao mesmo tempo, o individualismo é nefasto quando lança as pessoas em uma luta de todos contra todos.           
Os brasileiros e a sociedade brasileira têm recursos para trabalhar as “dores” do Brasil? 
Sim, sem dúvida. Políticas públicas são saídas possíveis, mas precisa haver movimento social que pressione por essas políticas. Uma coisa que talvez tenha sido um problema no governo Lula é que muita gente que se mobilizava até então se sentiu assim: “ah... conseguimos eleger o Lula e as coisas vão acontecer”. Houve uma desmobilização e o próprio estilo de governar do Lula contribuiu para isso. “Deixa que eu cuido... calma, gente, as coisas não podem ser tão rápidas...” Esse estilo de governar eu acho um problema, politicamente. Embora ele tenha sido um grande governante do ponto de vista administrativo. Mas, politicamente, ele se colocar como um “pai” – aí vem aquela história... a gente não pode sempre dizer sim para os filhos. Enfim, ele ajudou muito a desmobilizar. Tudo bem, o papel dele não era mobilizar. Mas era acolher a mobilização. E tem também o crescimento econômico, que desmobiliza. Houve a inclusão econômica de muita gente, pelo menos da classe C, que contribuiu também para desmobilizar. As pessoas se interessam menos pelas outras lutas na hora em que elas começam a ter oportunidades individuais. Começam a cuidar de suas vidas, a fazer suas revoluções individuais. De um modo geral, as pessoas lutam muito pouco por idealismo. E, na maior parte das vezes, só quando a água bate no pescoço. Aí é que acontece a grande luta. O importante é que quem está se mobilizando tenha inteligência política suficiente para saber que pontos políticos podem mobilizar, como é que se dialoga com a sociedade mobilizada. Para articular, para angariar aliados. Senão ficam pequenos guetos de manifestações que ou são reprimidos ou não falam com ninguém. A questão toda, na essência, é fazer política.    

Postado no Blog Brasil de Fato