Mostrando postagens com marcador desinformação. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador desinformação. Mostrar todas as postagens

“ Didier Raoult representa um dos piores ataques de desinformação e de ofensiva anticiência ”, diz TV francesa



Em programa de TV da França, jornalista Patrick Cohen diz que fenômeno Raoult foi “ponto de encontro do poder das redes sociais, de uma midiatização desenfreada e de um dos piores ataques de desinformação e de ofensiva anticiência”.


Willy Delvalle

O jornalista francês Patrick Cohen cobrou nesta quinta-feira no programa “C à Vous”, da emissora de televisão France 5, uma reação das autoridades francesas ao Dr. Didier Raoult, defensor da cloroquina para tratar a Covid-19, depois de um ano de provada a ineficácia do tratamento e nenhuma sanção adotada contra o médico.

Em editorial, o comentarista afirmou que “Didier Raoult é há mais de um ano um grande agente dessa crise, pelo menos segundo a opinião pública, ainda mais sendo um funcionário público”.

Cohen relembrou as mentiras contadas pelo diretor do Institut Hospitalier Universitaire de Marseille. “Ele foi a bússola que indica o sul: não há pandemia aqui, não há mortos em excesso no mundo, não há transmissão pelo ar, dizia ele, o que tornava as máscaras, o confinamento, as vacinas inúteis”.

“Raoult prometeu um remédio sem provas (de eficácia), nem precaução. Raoult produziu estudos falsos, como sabemos hoje. Ele tirou pacientes graves de ensaios clínicos”, aponta.

“Ele (Raoult) provocou inutilmente uma mobilização de dezenas de equipes de pesquisa, que tentaram encontrar provas com ensaios rigorosos, os quais ele se recusava a fazer”, afirma.

“Ele colocou a ciência em desordem e a opinião pública em confusão, acusando seus contraditores de serem corruptos. E agora ele anuncia uma denúncia por assédio contra a cientista especialista na pesquisa de fraudes, Elizabeth Bik, que lista cerca de 60 anomalias e falsificações nos estudos do IHU”.

“Tudo isso em nome de um estabelecimento público, outrora apresentado como polo de excelência da infectologia francesa. Mas isso não parece representar nenhum problema a ninguém”, critica.

“Nenhuma reação oficial em lugar nenhum. A Assistence Publique des Hopitaux de Marseille (instituição responsável pelos hospitais de Marselha, onde fica o IHU de Raoult) acha que é uma boa medicina? Não temos resposta”.

“A Université Aix-Marseille pensa que sua reputação saiu maior desse episódio?”, pergunta, em referência à universidade que abriga o IHU de Raoult.

“A Agência do Medicamento estima que os estudos produzidos pelo IHU são uma boa ciência?”, questiona.

“Uma autoridade de controle vai investigar as mais de 60 falsificações reveladas por Elizabeth Bik?”, cobra.

“O Ministro da Saúde acha que o dinheiro público foi bem utilizado? É normal que um outro professor universitário, o adjunto de Didier Raoult, Eric Chabrière continue proferindo ameaças e insultos contra seus colegas nas redes sociais? Ou de publicar, o que ele fez, o endereço pessoal de Elizabeth Bik?”, denuncia.


“Muitas vidas salvas em Marselha”: No Twitter, Raoult e seu adjunto Eric Chabrière continuam defendendo tratamento a base de hidroxicloroquina para Covid-19, mesmo depois de estudos da Organização Mundial da Saúde apontarem a ineficácia desse tratamento. Na imagem, os dirigentes do IHU de Marselha mencionam “artigo a ser publicado”.


“É normal ainda que um hospital universitário se torne referência dos negacionistas da pandemia, como dissemos, um dos pontos de referência de conspiracionistas, antimáscara, antivacina?”, em alusão a Jair Bolsonaro e Donald Trump, citados anteriormente no programa.

“Macron pensa que ele serviu a ciência e o interesse público, dando sua unção a Didier Raoult em Marselha, diante das câmeras? Os políticos que o apoiaram fizeram autocrítica?”

Em abril de 2020, o presidente francês Emmanuel Macron visitou Dr. Raoult no IHU de Marselha “ao abrigo das câmeras oficiais”. Foto: reprodução/TV France 24


“A mídia, jornalistas, apresentadores, estimam que dando microfone complacente a Didier Raoult, indo levar tapa na cara no seu escritório do IHU, pensam ter dado uma boa informação?”, pergunta, em alusão às entrevistas conduzidas por canais de TV franceses e as hostilidades do professor do Sul do país.

Ao longo de um ano de pandemia, a emissora francesa BFMTV exibiu três longas entrevistas com Didier Raoult


“Eu penso no ponto comum que une jornalistas e cientistas, produzir a verdade, mas quando dizem besteiras e mentiras não há nenhuma consequência sobre suas carreiras”.

“A história não está completamente escrita mas ela vai dizer certamente que aquilo que vocês (autoras do livro recém publicado “Raoult, une folie française”) terá sido o ponto de encontro do poder das redes sociais, de uma midiatização desenfreada e de um dos piores ataques de desinformação e de ofensiva anticiência. Isso é o que representa o fenômeno Raoult”, avalia.

“Isso requer prestar contas perante o poder público, às autoridades sanitárias. Não se deve de jeito nenhum importunar os fãs de Raoult?”, ironiza.

No fim de 2020, Didier Raoult foi alvo de denúncias de conselhos de medicina franceses por charlatanismo. Nenhuma punição foi decidida desde então.


Willy Delvalle Mestre em Sociologia e Filosofia Política pela Universidade Paris 7. Formou-se em Comunicação Social: Jornalismo na Unesp. Em São Paulo, foi professor voluntário de português a imigrantes e refugiados. Atualmente, cursa mestrado em União Europeia e Globalização na Universidade Paris 8.





“ Didier Raoult representa um dos piores ataques de desinformação e de ofensiva anticiência ”, diz TV francesa



Em programa de TV da França, jornalista Patrick Cohen diz que fenômeno Raoult foi “ponto de encontro do poder das redes sociais, de uma midiatização desenfreada e de um dos piores ataques de desinformação e de ofensiva anticiência”.


Willy Delvalle

O jornalista francês Patrick Cohen cobrou nesta quinta-feira no programa “C à Vous”, da emissora de televisão France 5, uma reação das autoridades francesas ao Dr. Didier Raoult, defensor da cloroquina para tratar a Covid-19, depois de um ano de provada a ineficácia do tratamento e nenhuma sanção adotada contra o médico.

Em editorial, o comentarista afirmou que “Didier Raoult é há mais de um ano um grande agente dessa crise, pelo menos segundo a opinião pública, ainda mais sendo um funcionário público”.

Cohen relembrou as mentiras contadas pelo diretor do Institut Hospitalier Universitaire de Marseille. “Ele foi a bússola que indica o sul: não há pandemia aqui, não há mortos em excesso no mundo, não há transmissão pelo ar, dizia ele, o que tornava as máscaras, o confinamento, as vacinas inúteis”.

“Raoult prometeu um remédio sem provas (de eficácia), nem precaução. Raoult produziu estudos falsos, como sabemos hoje. Ele tirou pacientes graves de ensaios clínicos”, aponta.

“Ele (Raoult) provocou inutilmente uma mobilização de dezenas de equipes de pesquisa, que tentaram encontrar provas com ensaios rigorosos, os quais ele se recusava a fazer”, afirma.

“Ele colocou a ciência em desordem e a opinião pública em confusão, acusando seus contraditores de serem corruptos. E agora ele anuncia uma denúncia por assédio contra a cientista especialista na pesquisa de fraudes, Elizabeth Bik, que lista cerca de 60 anomalias e falsificações nos estudos do IHU”.

“Tudo isso em nome de um estabelecimento público, outrora apresentado como polo de excelência da infectologia francesa. Mas isso não parece representar nenhum problema a ninguém”, critica.

“Nenhuma reação oficial em lugar nenhum. A Assistence Publique des Hopitaux de Marseille (instituição responsável pelos hospitais de Marselha, onde fica o IHU de Raoult) acha que é uma boa medicina? Não temos resposta”.

“A Université Aix-Marseille pensa que sua reputação saiu maior desse episódio?”, pergunta, em referência à universidade que abriga o IHU de Raoult.

“A Agência do Medicamento estima que os estudos produzidos pelo IHU são uma boa ciência?”, questiona.

“Uma autoridade de controle vai investigar as mais de 60 falsificações reveladas por Elizabeth Bik?”, cobra.

É importante dialogar com os mal informados, diz Maria Rita Kehl




Da Revista Brasileiros

Maria Rita Kehl: “É importante ganhar os mal informados, que veem o Estadão e o Jornal Nacional”


Em ato contra o golpe, a psicanalista afirmou que a crise política não passa da velha “luta de classes, num momento onde quem perde não são os empresários”

A crise política que nas últimas semanas ganhou ares de golpe de Estado acirrou-se na quarta-feira (16) com a ação conjunta da imprensa, de movimentos conservadores e do juiz Sergio Moro, que decidiu ele próprio quebrar o sigilo da Operação Lava Jato e divulgar grampos telefônicos envolvendo o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Bombardeados pela imprensa, boa parte da população está propensa a acreditar no discurso de que é necessário tirar a presidenta Dilma Rousseff do poder. Para a psicanalista Maria Rita Kehl, “não adianta ficar contra eles”.

“É muito importante ganhar aqueles que estão mal informados, que leem o Estadão e veem o Jornal Nacional”, afirmou Maria Rita, que na noite de ontem participou no teatro Tuca, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, do Ato Pela Legalidade Democrática. “Não adianta ficar contra eles. Se a gente não conversar com eles é a Globo quem vai fazer isso.”

A psicanalista lembrou que, embora lotado, aquele espaço na PUC é pequeno se todas as forças que estão atuando no País nesse momento forem levadas em consideração.

De acordo com ela, o que está por trás da crise é um velho problema brasileiro.

“Como sempre é a luta de classes, num momento onde quem perde com a crise econômica não são os empresários, que tem perdas menores, mas sim o povo, que perde seus trabalhos, suas casas e seus meios de subsistência.”



Postado no Luis Nassif Online



Um dia na vida do Perfeito Idiota Brasileiro (versão 2016)




Paulo Nogueira



Alguns anos atrás, escrevi um relato sobre o dia do Perfeito Idiota Brasileiro, o PIB.

O Brasil mudou, e com ele o PIB, e é por isso que atualizo agora sua jornada cotidiana.

O PIB, hoje, está pronto a hostilizar petistas onde quer que os encontre. Bate panelas quando Dilma aparece na tevê. Veste camisa da CBF e vai para a Paulista pedir o impeachment. Passa adiante, nas redes sociais, tudo que seja negativo para o governo, a começar pelo material do Revoltados Online.

Ele continua a ler, logo pela manhã, o site da Veja. Nele, Reinaldo Azevedo é, como sempre, leitura indispensável. Mas agora ele não deixa de acompanhar, também, Felipe Moura Brasil. Lamentou, na Veja, a demissão de Joice Hasselmann.

Um raro exemplo de loira inteligente.

Fora da Veja, alguns outros blogs fazem parte de sua rotina. Um deles é o de Ricardo Noblat.

Mitou ao sugerir que Dilma se suicidasse.

Sempre dá um jeito de passar também pelo blog de Lauro Jardim.

Erra barbaridade, mas é o cara mais informado do Brasil.

O PIB vai para o trabalho ouvindo CBN. Merval e Jabor o fazem entender melhor o mundo. Volta para casa com a Jovem Pan. Sente falta de Scheherazade na rádio.

Ela foi vítima da censura do governo. Canalhas.

As noites são dedicadas à informação pela tevê. Seus comentaristas prediletos são Marco Antônio Villa e William Waack. “Por que caras como eles não estão governando o Brasil?”, ele se pergunta com frequência. “Têm resposta para tudo, até para os problemas do yuan chinês.”

Ao ouvir Villa no Jornal da Cultura sempre lhe ocorre um paradoxo.

O Villa tem voz fina, mas fala grosso.

Às segundas, o Roda Viva é programa obrigatório. Um amigo petralha lhe disse que Augusto Nunes é o Brad Pitt de Taquaritinga, em tom de escárnio. Mas atribuiu isso a alguma das más leituras do amigo.

Jô ele gostava de ver, mas acabou desistindo depois que ele entrevistou Dilma.

Ganhou uma fortuna para fazer aquela entrevista. Gordo miserável, pensa que me engana?

Prefere agora ver, tarde da noite, Danilo Gentili. Vibrou quando soube que Gentili oferecera bananas a um negro que o incomodava. E gostou ainda mais quando o juiz decidiu que Gentili não fora racista.

São todos uns coitadinhos, estes negros. Só querem saber de cotas e outras mordomias.

A mesma opinião ele tem de outras minorias, como os homossexuais, os índios e as mulheres. Não engole também os nordestinos.

Deviam ser gratos a nós de São Paulo por darmos a eles empregos de pedreiros, lixeiros e domésticas, mas decidiram ter as mesmas coisas que nós, aqueles retirantes.

Com Gentili PIB conheceu outro site que agora faz parte de suas preferências: o Antagonista. O que mais o agrada, fora o tom, são os textos curtos, um ou dois parágrafos no máximo. PIB detesta textos longos, de mais de cinco parágrafos.

PIB não liga muito para música. Para ele, Chico, além de chato, é um petralha. Mereceu ter sido xingado na saída de um restaurante.

Queria estar lá pra dizer certas verdades praquele comunista.

Lobão e Roger do Ultrage não. Estes escrevem as coisas que têm que ser ditas. Denunciam a ditadura lulodilmopetista. Lobão até compôs uma música contra Dilma. Ele achou a música genial, embora não tenha ouvido. Quer dizer, não ouviu até o fim. Ouviu 30 ou 35 segundos, e não conseguiu ir adiante. Mesmo assim, foi o suficiente para ver que é uma obra prima que será ouvida daqui a cem anos.

O cara foi brilhante em financiar seu disco com uma vaquinha virtual.

PIB contribuiu com zero, mas ficou impressionado com a iniciativa de Lobão.

Ele acha o Brasil o pior país do mundo. O mais corrupto.

Ainda bem que surgiu o Moro pra salvar a gente.

Ele torce para que Moro seja candidato à presidência em 2018. Se não for, Bolsonaro é um ótimo nome. Aécio não: é frouxo, um petista disfarçado. Esperava que Joaquim Barbosa se candidatasse em 2014. Comprou até máscaras de JB no Carnaval daquele ano. Mas nada.

Teve uma surpresa quando ouviu Moro pela primeira vez. Lembrou-se imediatamente de Villa.

Fala fino, mas tem voz grossa.

Admira também Eduardo Cunha, mas o governo inventou coisas contra ele. Lera, em algum lugar, que Dilma comprara dos suíços um falso dossiê para incriminar Cunha.

Os caras não se detêm por nada, filhos da puta.

PIB pensa em mudar do Brasil. Está pesquisando apartamentos em Miami.

Que adianta você ter carro se todo mundo tem? Viajar de avião se todo mundo viaja? Fazer compras num shopping se todo mundo faz? Assinar Netflix se todo mundo assina?

Mais recentemente, irritou-se em particular com as bicicletas em São Paulo.

Vontade de fazer um strike com ciclistas …

Ele já se imaginou mais de uma vez fazendo isso: atropelando ciclistas em série, como se ele fossem peças de boliche.

Na hora de dormir, PIB volta a pensar em deixar o Brasil enquanto espera seu Frontal fazer efeito.

Uma única coisa o faria desistir do sonho: São Paulo se separar do resto do Brasil.

Chega de sustentar os preguiçosos.

E então ele dorme o sonho profundo dos perfeitos idiotas.



Postado no Diário do Centro do Mundo em 14/01/2016



Mídia decreta : " Somos todos idiotas "





Saul Leblon, no site Carta Maior


A ilusão de que a barbárie é um processo incremental que se desenvolve em algum ponto remoto do planeta, ou do calendário, ofusca uma rotina de convívio com a sua plena vigência nos dias que correm.


A matança em Paris na última sexta-feira, o avanço de um mar de lama assassina no interior brasileiro, são ilustrações de uma transição de ciclo histórico, cuja raiz é sonegada ao discernimento social pela semi-informação emitida do aparelho midiático conservador. 


A cada soluço do inaceitável ergue-se, assim, a boa vontade dos que farejam algo estranho arranhando a porta do lado de fora. 

Em janeiro, dizíamos ‘Somos todos Charlie’.

Em setembro dissemos ‘Somos todos Aylan Kurdi’ ( o menino curdo de três anos, morto em uma praia na Turquia).

Em novembro estamos dizendo ‘Somos todos franceses’, pranteando a centena e meia de jovens assassinados em uma única noite em Paris. 

Por que estamos sendo jogados periodicamente a nos identificarmos com vítimas de uma tragédia que se abate sem que se possa detê-la, nem explicar de onde se origina e por que se repete em formas diversas com a mesma gravidade?

A lista é interminável.

Se a mídia desse a ênfase adequada a outros dramas equivalentes, por certo teríamos dito também ‘somos todos gregos’, ‘somos todos sírios’, ‘somos todos africanos’, ’somos todos desempregados europeus’, somos todos despejados espanhóis, somos todos líbios, iraquianos, iranianos, pretos americanos pobres...

Se desse hoje o alarme suficiente à lamacenta catástrofe promovida pela Vale, em Minas Gerais, estaríamos dizendo ‘Somos todos rio Doce’....

A solidariedade exclamativa é importante ao evidenciar a nossa inquietação.

Mas é insuficiente. 

Quando o que está em jogo é a incompatibilidade entre a ganância estrutural dos mercados e a dos impérios, de um lado; e a sobrevivência do interesse público, de outro, a boa intenção exclamativa, a exemplo da caridade cristã, não é capaz de afrontar os perigos que acossam as bases da sociedade e o seu futuro.

A desordem mundial, movida a incertezas, brutalidades psicopatas, insegurança social permanente e colapsos recorrentes movidos a forças intangiveis, não retrocederá se não for afrontada com anteparos do interesse público dotado de ferramentas à altura do desafio: Estados nacionais democraticamente fortalecidos.

A ausência de coordenação global entre economias, a subordinação da democracia a interesses financeiros que se dedicam a esvaziá-la, a incompatibilidade entre a acumulação irracional e a sobrevivência dos recursos que formam as bases da vida na terra, não serão superados com boas intenções de organismos não governamentais.

A crise de 2008 foi o sintoma desse corredor estreito da história para onde estão sendo tangidas referências e conquistas acumuladas pelas lutas democráticas e populares desde os primórdios do século 20 e antes dele.

Ao contrário do que recitam colunistas agendados pelos departamentos de economia dos bancos, ela não acabou.

O cerco em marcha se estreita, como evidenciam os acontecimentos de Paris, ou seus equivalentes na Síria.

A emergência do ciclo neoliberal nos anos 70 deu carta branca à ganância rentista, confiante na expertise do dinheiro para alocar recursos com maior eficiência ao menor custo, tendo o globo como tabuleiro cativo.

Os alicerces da democracia social (o pleno emprego, direitos universais, Estado, partidos e sindicatos forte) foram corroídos.

Sob explosões de bolhas, bombas, desemprego, náufragos, governos e nações acuadas por defenderem a destinação social do desenvolvimento, o século 21 assiste agora aos efeitos colaterais dessa troca.

Um poder de chantagem ímpar, dotado de mobilidade sem igual na história do capitalismo ungiu o bunker financeiro em carrasco das nações.

O preço da mutação é o novo normal sistêmico.

A desigualdade cresce, o emprego definha, o endividamento asfixia famílias e Estados, a política se desmoraliza, fundos e acionistas enriquecem em uma sociedade que vegeta, e sobretudo, quando ela empobrece.

A barragem acumula rejeitos de todas as raças, cores e religiões.

Não há lugar para todos serem a mesma coisa em parte alguma nessa engrenagem seccionada por diques que separam vidas sólidas de massas líquidas lamacentas.

Se o Estado é capturado integralmente pelos mercados, as pontes para a construção de laços de valores compartilhados entre as nações e dentro das nações ficam intransitáveis.

Os terroristas que mataram 127 jovens em uma só noite em Paris diziam exatamente isso enquanto disparavam: 

‘Vamos fazer com vocês o que vocês fazem na Síria’, em alusão ao intervencionismo aberto do governo Hollande que se estende da Síria ao Iraque, do Iraque a nações africanas.

Estamos falando de um governo socialista, ou melhor, de mais um sintoma da doença maligna que faz da política o novo idioma do caos. 

A chave religiosa apenas reforça esse hospício ordenado pela razão financeira, que instala uma guerra social aberta de abrangência global, em nosso tempo.

Frentes conflagradas espalham-se pelos mapas das nações e dentro de cada uma delas, nas periferias urbanas onde os rejeitos humanos dos embates se acumulam. 

Volta e meia ali também as barragens se rompem.

A UE tem hoje 8 milhões de imigrantes sem papéis; 120 milhões de pobres e 27 milhões de desempregados.

Após seis anos de arrocho neoliberal para curar a trombose de 2008, o desemprego, a desigualdade, o futuro obscuro, o esfarelamento do padrão de vida dos trabalhadores e da classe média – condensado em uma geração de jovens que dificilmente repetirá a faixa de renda dos pais -- turbinou a rejeição ao estrangeiro, criou o medo da 'islamização, alimentou a extrema direita e liberou a demência terrorista dos alijados.

Não necessariamente nessa ordem, mas com essa octanagem. 

A consciência dessa longa travessia é um dado fundamental para renovar a ação política num tempo de supremacia das finanças desreguladas, ungidas à condição de um templo sagrado, dotado de leis próprias, revestido de esférica coerência endógena, avesso ao ruído das ruas, das urnas e das aspirações por cidadania plena.

Corta. Feche o foco agora no Brasil dos dias que correm.

É nesse cenário de guerra aberta que o conservadorismo e seu jornalismo de propagação ‘acusam’ o governo de não ter jogado o país ao mar em 2008, como tantos ‘estadistas’ do ajuste fizeram.

O custo de não tê-lo afogado na hora certa –vertem boquirrotos economistas de bancos-- acarretou os custos insustentáveis que ora explodem em desequilíbrios fiscais e orçamentários

O ‘voluntarismo lulopopulista’ terá que ser pago a ferro e fogo, lambuza nossos ouvidos a voz pastosa do sociólogo Fernando Henrique Cardoso, com seu conhecido domínio da macroeconomia.

Recomenda-se vivamente beber a cota do dilúvio desdenhada em 2008 de uma talagada só, como Joaquim Levy gostaria, encorajado pelo poleiro de tucanos da Casa das Garças.

Só há um jeito de escapar da loucura disfarçada de racionalidade: tirar a economia do altar sagrado da ortodoxia e expô-la ao debate democrático do qual participem todas as forças sociais, unidas em uma frente de propósitos específicos.

Novo corte para um close na gosma em movimento no Brasil.

Pode-se identifica-la literalmente na massa de lama derramada de uma barragem da mineradora Vale, que já atingiu nove municípios de Minas e do Espírito Santo e avança para matar 880 kms de rios, riachos, ribeirões e fontes.

Referência de sucesso da privatização tucana, recordista em distribuir dividendos a seus acionistas, a Vale durante anos só deixou 1% do lucro obtido na mineração de Mariana/MG ao município.

Em compensação, despejou agora 60 bilhões de litros de lama tóxica no seu entorno, uma lava que viaja pelo Rio Doce para compartilhar com o Espírito Santo a maior catástrofe ambiental da história brasileira.

A devastação está apenas no começo.

A convalescença pode demorar séculos.

Esse é o tempo - advertem geólogos - para que a lama cuspida pela incúria gananciosa se transforme em solo fértil outra vez.

A Vale não vai cuidar do interesse público nessa longa mutação. 

O governo Dilma já deveria ter montado um gabinete de crise para enfrenta-la e coagi-la a assumir custos, no limite com intervenção na empresa para saber a extensão das ameaças que esconde.

No vácuo, o prefeito Neto Barros (PCdoB-ES), de B.Guandu (ES), fez o que cabe diante das dimensões de um roteiro que começa com o colapso do abastecimento de água, avança para doenças, inclusive câncer, encerra a destruição de cadeias alimentares, representa a falência de agricultores e de cidades, e desemboca em desemprego, revolta e migrações para periferias conflagradas.

Neto Barros fechou a ferrovia da Vale com a patrulha de máquinas da prefeitura até que a presidência da empresa aceite negociar.

Pergunta: isso é terrorismo? É atentado? 

Não. 

Mutatis mutante isso é a reação desesperada à supremacia dos interesses de mercado sobre a segurança da sociedade, o bem-estar das populações, a preservação das fontes da vida e o direito ao futuro sonegados por um bombardeio de lama.

Numa entrevista famosa em 2009, ao portal da revista Veja, FHC justificou a venda da Vale do Rio Doce - que tinha em Serra o defensor mais entusiasmado, entregou o ex-presidente - entre outras razões, ao fato de a 2ª maior empresa de minério do mundo ter se reduzido - na sua douta avaliação - a um cabide empregos estatal, 'que não pagava imposto, nem investia'. 

Filho dileto do ciclo tucano das grandes alienações públicas, Roger Agnelli - presidente da Vale do Rio Doce de 2001 a 2011 - foi durante anos reportado ao país como a personificação da eficiência privada reconhecida nessa transação.

Com ele, graças a ele, e em decorrência da privatização-símbolo que ele encarnou, a Vale tornou-se uma campeã na distribuição de lucros a acionistas. 

Vedete das Bolsas, com faturamento turbinado pela demanda chinesa por minério bruto, que o Brasil depois reimportava, na forma de trilhos, por exemplo, - a única laminação para esse fim foi desativada pelo governo FHC - a Vale tornou-se o paradigma de desempenho corporativo aos olhos dos mercados. 

Um banho de loja assegurado pelo colunismo econômico, ocultava a face de um negócio rudimentar, um raspa-tacho do patrimônio mineral alçado à condição de referência exemplar da narrativa privatista. 

Agora se vê o mar de lama acumulado por debaixo do veludo.

A 'eficiência à la Agnelli' lambuzou o noticiário pró-mercadista durante uma década de fastígio. 

Da cobertura econômica à eleitoral, era o argumento vivo a exorcizar ameaças à hegemonia dos 'livres mercados' pelo lulopopulismo. 

Projetos soberanos de desenvolvimento, como o da área de petróleo, eram fuzilados com a munição generosa da menina dos olhos do neoliberalismo: a Vale de balancetes nas nuvens.

A política agressiva de distribuição de lucros aos acionistas -- na verdade um rentismo ostensivo, apoiado na lixiviação de recursos existentes, sem agregar capacidade produtiva ao sistema econômico-- punha na Petrobrás o cabresto do mau exemplo. 

Era a resiliência estatista nacionalisteira, evidenciada em planos de investimento encharcados de preocupação industrializante e 'onerosas' regras de conteúdo local. 

A teia de acionistas da Vale, formada por carteiras gordas de endinheirados, bancos e fundos, com notável capilaridade midiática, nunca sonegou gratidão .

Enquanto o mundo mastigava avidamente o minério de teor de ferro mais elevado do planeta, a Vale era incensada a cada balanço, seguido de robustas rodadas de distribuição de lucros e champanhe. 

No primeiro soluço da crise mundial, em 2008, a empresa administrada pela lógica pró-cíclica dos rentistas reagiu como tal e inverteu o bote: foi a primeira grande empresa a cortar 1.300 trabalhadores em dezembro daquele ano, exatamente quando o governo Lula tomava medidas contracíclicas na frente do crédito, do consumo e do investimento. 

A Petrobrás não demitiu; reafirmou seus investimentos no pré-sal, da ordem de US$ 200 bilhões até 2014. 

Se a dirigisse um herói dos acionistas, teria rifado o pré-sal na mesma roleta da Vale: predação imediatista, fastígio dos acionistas e prejuízos para o país. 

Em seu último ano na empresa, Agnelli - -apoiador confesso da candidatura derrotada de Serra contra Dilma, em 2010 - distribuiu US$ 4 bi aos acionistas. 

Saiu carregado nos ombros da república dos dividendos.

Indiferente aos apelos de Lula, manteve-se até o fim fiel à lógica que o ungiu: recusou-se a investir US$ 1,5 bi numa laminadora de trilhos que agregasse valor a um naco das quase 300 milhões de toneladas de minério bruto exportadas anualmente pela empresa. 

Com a derrota de Serra, o conselho da Vale destituiu o camafeu ostensivo da coalizão tucanorentista, em abril de 2011. 

Agora se sabe que o centurião de alardeada proficiência administrativa, além de recolher apenas 2% de royalties ao país, nunca conseguiu reunir recursos para instalar uma simples buzina, que poderia ter salvo vidas levadas pelo mar de lama que legou ao país, enquanto brindava os acionistas com bilhões.

Estamos diante de um exemplo em ponto pequeno da desordem global, que à falta de melhor conceito, pode ser batizada de barbárie de mercado.

É rudimentar conceito. Porém é mais encorajador do que dizer apenas e tristemente ‘somos todos idiotas’.



Por que propagamos notícias falsas




Alessandro Martins

Se há alguns anos era relativamente fácil localizar a origem de uma notícia falsa (quem não lembra do caso da Escola de Base?), hoje as responsabilidades desse tipo ficaram mais diluídas.

Mais e mais pessoas participam ativamente do processo de propagação de informações.

Existem alguns motivos que fazem com que propaguemos notícias falsas, participando ativamente de um processo que é mais de desinformação do que propriamente benéfico.

A notícia preenche algum tipo de expectativa pessoal e social: basear uma ação, qualquer uma, em expectativas em vez de baseá-la em fatos quase sempre é um erro. No entanto, uma boa parte das informações nas redes sociais se desloca assim.

Essa expectativa pode ser catastrófica em diferentes níveis: nível baixo (Xuxa processando o Twitter), nível médio (o risco de um vírus que apaga o HD), nível alto (uma determinada cidade foi atingida por um terremoto), não importa, participar da propagação de uma informação falsa como essa envolve sentimentos que vão do se mostrar revoltado com algo que aconteceu ao da solidariedade com os pais de uma criança supostamente raptada, se ficarmos no exemplo acima. Queremos nos envolver.

Essa expectativa pode ser benéfica em diferentes níveis: é o caso dos emails que dizem que você ganhará um celular ou outro produto se enviar a mensagem para determinado números de contatos (não é sorteio); ou do bebê que ganhará 5 centavos da AOL para cada email enviado. Mais uma vez queremos ajudar.

Não importa o tipo de expectativa: queremos ser um dos participantes do processo de preenchimento dessas expectativas por pura empatia. Um hoax (notícia falsa que se espalha na internet) que nos pede que ajudemos uma criança que está morrendo por conta de uma doença rara, por exemplo, conta com a compaixão existente em quase todos os seres humanos. A notícia falsa de que a Xuxa processaria o Twitter conta com a revolta que isso causaria em quase todos os usuários do Twitter (nesse caso específico, o julgamento da informação também foi prejudicado por informações passadas, outras celebridades já processaram outros serviços da internet, assim, formando um outro componente das expectativas).

Incapacidade de agir: ao mesmo tempo em que queremos nos sentir participantes do processo, empáticos e identificados com as expectativas de um grupo, não queremos tomar atitudes que nos tirem de nossa comodidade. Assim, é muito cômodo acreditar que estamos ajudando ou fazendo uma denúncia importante apenas apertando o botão de enviar, dando um RT ou mesmo assinando uma petição online.

Velocidade: é fácil apertar o botão de forward e enviar ou é fácil dar RT ou mesmo publicar um post em um blog. Rapidamente uma informação se espalha e, por presença massiva, ganha o status de verdade propagando-se ainda mais facilmente. Por conta dessa facilidade, atendemos todas as necessidades acima (empatia, preenchimento de expectativas, etc) com grande negligência.

Responsabilidade diluída: a responsabilidade é de todos, logo, aparentemente, não é de ninguém. Embora, sim ao propagar uma informação você se compromete eticamente com sua veracidade e com as consequências advindas de sua propagação. Você já deve ter recebido um email do tipo descrito acima com os dizeres: “não sei se é verdade, mas em todo caso estou mandando” ou “nunca se sabe”. Frases desse tipo me dizem “apague sem ler”, mas normalmente muitas pessoas acabam dizendo “deve ser verdade” ou “pode ser verdade”. E reinicia-se o processo de empatia e preenchimento de expectativas.

Como evitar

A receita é fácil, embora exija esforço por ser necessário sair de processos automáticos e adotar-se métodos mais analíticos. Embora esses métodos mais analíticos sejam simples, abandonar maus hábitos sempre exige determinação, constância, disciplina e atenção.

Enquanto não conseguir fazer isso sistematicamente, conte até 10 antes de dar RT no Twitter ou enviar pelo email.

Duvidar das informações que você recebe da internet, nos jornais, na tv, no rádio, não importa a fonte.

Verificar a real relevância do fato é mesmo importante, negativa ou positivamente, a divulgação de determinada informação? Para quem?

Checar, às vezes uma checagem no Google é suficiente, mas nem isso costuma-se fazer. No entanto, às vezes é melhor checar com os próprios envolvidos pela notícia ou esperar que alguém o faça.

Não perca a oportunidade de ficar quieto, se ausentar de certos processos de propagação da informação (ou desinformação) não vai tirar pedaço de ninguém.


Alessandro Martins

Trabalhei como jornalista em Curitiba de 1995 a 2008, quando fui demitido e passei a me dedicar a escrever apenas na internet, em blogs e mídias sociais. 

Postado no blog Livros e Afins em 28/06/2013