USP-Ariel: as minutas de uma afronta ao direito internacional



Já em seu preâmbulo, a linguagem usada no acordo está em patente contradição com a lei internacional: o Ariel University Center of “Samaria” não fica em Israel. Ele está localizado na colônia de Ariel, na Cisjordânia, parte do território reconhecido pela legislação internacional como palestino e ilegalmente ocupado por Israel desde 1967. Esta colônia, especificamente, começou a ser construída em 1978, numa invasão militar que confiscou terras cultivadas e terrenos rochosos que os aldeões palestinos usavam para as pastagens de seus rebanhos. Como explica Indra Seixas Neiva em seu TCC: a área municipal da colônia de Ariel possui vários enclaves de propriedades privadas palestinas, cujos acesso é proibido aos proprietários impedidos pelo Muro que separa sete aldeias do norte de Salfit (Hares, Kifl lebres, Qira, Marda, Jamma’in, Zeita-Jamma’in e Deir Istiya) de acessar suas terras e rebanhos, com cerca de 25.000 palestinos prejudicados uma vez que dependem de uma variedade de serviços da cidade centro da região de Salfit (p.34).
Sempre que se fala nas colônias israelenses em território palestino, é boa ideia ter em mente a brutalidade do processo, para que não se perca de vista que ele inclui constantes expulsões, monopólio de água, estatuto jurídico diferenciado para colonos, presença do exército de ocupação como seus garantidores, violências permanentes contra a população palestina e os onipresentes checkpoints. O mapa que segue mostra o caminho que devem fazer os palestinos dos vilarejos ao norte de Ariel para chegar ao centro urbano regional, Salfit, bloqueados pelo Muro do Apartheid:
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Fonte: B’Tselem.

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O convênio da USP com a Ariel, estabelecido em 2010 e com vigência de cinco anos, prevê troca de informações e publicações, visitas mútuas de pesquisadores, intercâmbio anual de delegações e outras formas de colaboração. Sendo a Ariel uma instituição cuja mera existência já é uma afronta ao direito internacional, nos encontramos na triste situação de que a mais prestigiosa e reconhecida universidade brasileira está validando e legitimando uma ocupação ilegal amplamente condenada nas Nações Unidas. De novo, nas palavras de Indra Seixas Neiva: O convênio da USP com uma instituição localizada nos TPO [Territórios Palestinos Ocupados] é uma afronta gravíssima ao direito internacional e funciona como instrumento facilitador e normalizador da situação de ilegalidade das colônias judaicas, da construção do Muro de separação e dos crimes cometidos contra os palestinos (p.38).
Trata-se, efetivamente, de colaboração com a criminalidade internacional. A Fórum também apurou que há pouca notícia entre os professores acerca de existência e das implicações desse convênio. Não surpreende, dado o histórico recente de bloqueio a iniciativas de discussão da situação palestina na USP. Em 2006, quando o Professor Osvaldo Coggiola convocou um ato “contra o massacre no Líbano e na Palestina”, a autorização para o uso do Anfiteatro Camargo Guarnieri, que havia concedida pela reitoria, foi revogada na última hora, enquanto os serviços de informação da USP disseminavam a falsa notícia de que o ato havia sido cancelado. O mesmo aconteceria em 2010 com Maren Mantovani, diretora de Relações Internacionais da Campanha Palestina contra o Muro do Apartheid, convidada a participar de um evento na Faculdade de Economia e Administração (FEA): o local também foi desautorizado na última hora.
Fica aqui então, reiterado, o pedido de explicações sobre esta flagrante afronta à lei internacional por parte da USP. A página do ICMC-USP, São Carlos, lista a Profa. Márcia Ferguson como responsável pelo convênio.
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Este post é dedicado, em admiração e solidariedade, a Indra Neiva Seixas, que se encontra agora na Cisjordânia monitorando abusos dos direitos humanos por Israel, servindo no programa de acompanhamento do EAPPI. Sem ela, não teria sido possível compilar a maior parte das informações contidas aqui.
Postado no Blog Revista Fórum em 29/02/2012

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